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Competição poderia explicar assédio?

Pesquisadores da Universidade Norueguesa de Ciência e Tecnologia (NTNU) entrevistaram garotos e garotas heterossexuais para entender mecanismos que estão por trás do assédio sexual.

Por Jairo Bouer
Atualização:

Se você acha que competição sexual é apenas aquela estratégia utilizada pelos animais para aumentar sua chance de se reproduzir, como a exibição de atributos físicos (a famosa cauda do pavão), ou ainda aquelas brigas medonhas para mostrar quem é mais forte, está redondamente enganado. Ela estaria acontecendo também entre os humanos o tempo todo, embaixo dos nossos olhos, até na escola dos seus filhos. Pelo menos é o que sugere um novo estudo divulgado na última semana.

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Pesquisadores da Universidade Norueguesa de Ciência e Tecnologia (NTNU) entrevistaram 1.326 garotos e garotas heterossexuais com idade em torno dos 18 anos, buscando entender os mecanismos que estão por trás do assédio sexual. Eles focaram em dois tipos de assédio, sem contato físico: o primeiro, entre sexos opostos, que consistia em uma tentativa de obter sexo e, o segundo, entre jovens do mesmo sexo, que tinha mais relação com as intimidações. As informações são do jornal inglês Daily Mail.

Garotas, por exemplo, para se mostrarem mais “desejáveis” e “atraentes” aos olhos dos garotos, podem tentar denegrir a imagem das colegas dizendo que elas são feias, “galinhas”, perdedoras, entre outras “pérolas”. Meninos podem fazer o mesmo dizendo que os outros garotos são fracos, nerds, gays, etc. 

Embora esses padrões de comportamento possam ser muito parecidos com os do bullying, para os especialistas são apenas estratégias para aumentar a probabilidade de se conseguir sexo, ao mesmo tempo que se tenta reduzir as chances dos “rivais”. Em outras palavras, competição sexual!

Adolescentes que já começaram a fazer sexo casual são mais propensos a assediar sexualmente seus colegas. Esse assédio pode acontecer de diversas formas, como humilhação, intimidação, xingamentos, fofocas e até violência física. Uma vez iniciada a prática de sexo casual, o jovem tenderia a achar mais aceitável fazer sexo sem consentimento do parceiro ou sem proximidade emocional. E, fechando esse ciclo “vicioso”, os jovens que foram vítimas de assédio sexual também se tornariam mais propensos a fazer sexo casual. 

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E o assédio sexual pareceu muito comum no estudo. Nele, 60% dos jovens disseram ter sofrido alguma forma de assédio no ano anterior à pesquisa. Além disso, 30% das garotas e 45% dos garotos admitiram ter praticado, eles mesmos, alguma modalidade de intimidação de cunho sexual com os colegas, pelo menos uma vez na vida. 

A forma mais comum de assédio, surpreendentemente, não foi a de meninos contra meninas. E, sim, entre os próprios garotos, principalmente colocando em dúvida a orientação sexual dos colegas. O assédio das meninas sobre os meninos foi o tipo menos comum. 

Para os pesquisadores, os resultados mostram que os dois sexos assediam e são assediados. Assim, a melhor perspectiva seria olhar para garotos e garotas como alvos e como perpetradores dessas intimidações.

Os cientistas sugerem que é fundamental mudar as atitudes sobre o assédio. Assim, trabalhar essa situação nas escolas deveria ser uma prática mais comum. 

Alguns trabalhos anteriores sugerem que intervenções pontuais sobre a questão do assédio sexual fazem com que os jovens passem a ter uma visão mais crítica e negativa dessas intimidações, mas não reduzem necessariamente a sua ocorrência. O que fazer, então?

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Da mesma forma que hoje existem intervenções mais estruturadas para prevenção do bullying nas escolas (estadao.com.br/e/bullyingnasescolas), os cientistas acreditam que trabalhar assédio sexual dentro do plano de ensino, com estratégias como dramatizações, com roteiros bem escritos e participação ativa dos alunos, poderia fazer toda a diferença.

E, por tabela, se a questão do assédio for melhor trabalhada desde a escola, talvez esse comportamento tenha menor escala no futuro, tornando a vida de mulheres e homens adultos muito mais fácil.

* JAIRO BOUER É PSIQUIATRA

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