Entenda a investigação federal sobre o leite adulterado

Ilegal, a adição de soda cáustica e de água oxigenada ao leite torna mais barato o processo de industrialização

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Por Redação
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Na segunda-feira, dia 22, a Polícia Federal (PF) prendeu 27 pessoas e desarticulou um esquema de crimes contra a saúde pública, cometidos por meio da adição de substâncias químicas não permitidas ao leite longa-vida, o que o tornava impróprio para consumo. Conforme as investigações do Ministério Público Federal (MPF), a Cooperativa dos Produtores de Leite do Vale do Rio Grande (Coopervale), em Uberaba, e a Cooperativa Agropecuária do Sudoeste Mineiro (Casmil), em Passos, são suspeitas de acrescentar ao leite soda cáustica (hidróxido de sódio) e água oxigenada (peróxido de hidrogênio). Confira os lotes sob suspeita As substâncias, de acordo com a PF, eram diluídas em água - junto com outras, como citrato de sódio e ácido cítrico -, numa proporção de 10% do total, e usadas para aumentar a longevidade do produto e reduz a acidez. O MPF alertou que as substâncias, se utilizadas em desacordo com os parâmetros químicos indicados, "podem se transformar em poderosos agentes cancerígenos". Ilegal, a adição de soda cáustica e de água oxigenada ao leite torna mais barato o processo de industrialização. Quando o produto tem microrganismos em excesso, em decorrência da falta de higiene, a água oxigenada age esterilizando-o. Substitui a refrigeração, que é o procedimento recomendado, mas mais caro. A soda cáustica acaba com a acidez do leite, provocada por microrganismos - como o leite não está ácido, tem-se a impressão de que está livre de impurezas. Os esquemas de adulteração do leite começaram a ser investigados há cerca de quatro meses, com base em denúncias de outras cooperativas e de ex-funcionários das empresas. No dia 16 de agosto, o MPF interceptou duas carretas em Passos com leite cru da Casmil. O boletim de análise de leite do Serviço de Inspeção Federal que acompanhava a carga atestava ausência de conservantes, mas a análise dos produtos feita pelo Laboratório Nacional Agropecuário (Lanagro) confirmou a fraude e a presença, em todas as amostras, de água oxigenada. Segundo a avaliação técnica, o procedimento criminoso teria por objetivo a "recuperação" do leite estragado ou impróprio para o consumo que chegava dos produtores rurais. Como parte da Operação Ouro Branco, foi determinado o recolhimento de amostras de leite longa-vida em todo o País. Segundo a PF, o produto adulterado era revendido pelas cooperativas para empresas como Parmalat e Calu, entre outras, que comercializavam o produto em embalagens próprias em todo o território brasileiro. A produção diária das cooperativas chegava a 400 mil litros (250 mil da Casmil e 150 mil da Coopervale). As promotorias de Defesa do Consumidor em Uberaba e Passos determinaram a suspensão da produção e a apreensão dos estoques de leite de ambas. A Parmalat informou por meio de nota que encaminhou mais de 50 amostras de todo o Brasil para análise, "procedimento que é rotineiro", e já descredenciou as cooperativas investigadas pela PF (Casmil e Coopervale), das quais "comprava apenas leite cru em quantidade muito reduzida". A empresa também colocou à disposição o telefone 0800 11 22 22 para esclarecimentos. Decisão cautelar A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) informa que os resultados dos testes que indicarão a existência da mistura de soda cáustica ou água oxigenada no leite deverão sair em quinze dias. Enquanto isso, proibiu em todo o País a comercialização de leites integrais longa-vida das empresas Parmalat e Calu. E a Vigilância Sanitária de Minas Gerais determinará a proibição da venda de leites da marca Centenário. As medidas não valerão para todos os leites dessas marcas, mas apenas para alguns lotes. Prisões Entre os presos, estão dirigentes da Coopervale e da Casmil - apontados como possíveis chefes do esquema - e funcionários das cooperativas. Em Passos, a PF vasculhou fábrica, escritório e a residência do presidente da Casmil, Dácio Francisco Delfraro, que foi preso. Um químico também foi preso. Os nomes dos outros presos não foram divulgados. Riscos para o consumidor Em doses concentradas, como as usadas para limpeza doméstica, a soda cáustica provoca queimadura no esôfago e no estômago, o que leva a uma inflamação aguda e até mesmo a úlceras e sangramentos. No entanto, em quantidades diluídas, como no caso do leite adulterado encontrado em Minas, os efeitos são bem menos nocivos. De acordo com o médico Dan Linetzky Waitzberg, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e diretor do Grupo de Nutrição Humana (Ganep), as reações mais comuns a quem ingeriu a bebida podem ser inflamações na mucosa do esôfago e do estômago, que fazem com que a pessoa sinta náuseas, vômitos ou diarréia.

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