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Fumiguemos

Em vez de entrar em pânico, é preciso eliminar os mosquitos

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Por Redação
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Pandemias dão bons filmes de horror. Há poucas coisas tão assustadoras quanto uma doença nova, perigosa e incurável, que se espalha rapidamente. E, com a globalização, as infecções agora são capazes de percorrer distâncias enormes, a uma velocidade estonteante. Doenças como aids, Sars (Síndrome respiratória aguda grave), febre do vírus do Nilo Ocidental e febre do ebola surgiram em lugares tão díspares quanto as selvas africanas e os mercados de aves da China. Então eclodiram, levando pânico ao mundo inteiro.

O terror mais recente é o zika. Transmitido por mosquitos, o vírus apareceu originalmente na África e no ano passado foi detectado no Brasil. Agora está se disseminando pela América Latina e pelo Caribe, com casos registrados em mais de 20 países. Num primeiro momento, pensava-se que ele causava pouco mais que coceiras, vermelhidões e febre. Agora, conferindo à doença status de pesadelo, os médicos desconfiam que quando uma mulher grávida é infectada, seu bebê corre o risco de apresentar defeitos congênitos. O zika é o principal suspeito pelo aumento acentuado no número de recém-nascidos com microcefalia no Brasil. As crianças nascem com um crânio menor que o esperado e muitas vezes têm o cérebro comprometido. Podem ser afetadas por graves dificuldades de aprendizagem, convulsões e outros problemas. Muitas morrerão jovens.

O zika é o principal suspeito pelo aumento acentuado no número de recém-nascidos com microcefalia no Brasil Foto: REUTERS/Ueslei Marcelino

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Os cientistas tentam confirmar a relação entre o zika e a microcefalia. Alguns desconfiam que em adultos infectados o vírus também pode causar sérios danos aos sistemas nervoso e imunológico. Ainda que a principal forma de transmissão sejam as picadas de mosquito, receia-se que a doença também possa ser contraída sexualmente. Mas, será que os riscos são tão grandes que os países livres do vírus devam recomendar a seus cidadãos que evitem os lugares onde sua presença foi confirmada? Será que populações inteiras serão contaminadas, levando a uma imunização indireta (herd immunity)? Será que, nesse caso, as mulheres devem tentar não engravidar enquanto isso não acontece, como têm sugerido alguns países latino-americanos?

O zika não tem cura e vacinas só estarão disponíveis daqui a uma década, no mínimo. No entanto, isso não é razão para desespero - nem é motivo para que as autoridades governamentais espalhem o medo na tentativa de dissuadir as mulheres de ter filhos. Duas coisas são certas. A primeira é que a principal, e possivelmente única, forma de transmissão é a picada dos mosquitos, que contraem o vírus de pessoas infectadas e o transmitem para suas próximas vítimas. A segunda é o que fazer para reduzir o número de mosquitos - e, de preferência, erradicá-los.

O combate aos mosquitos tem uma longa história. No início dos anos 60, depois de uma prolongada campanha contra a dengue, o Aedes aegypti, espécie que hospeda não só o zika, mas também a dengue, a chikungunya e a febre amarela, foi quase erradicado em grande parte da América do Sul. As fumigações frequentes aniquilaram o mosquito. Agentes de endemias visitavam as casas para instruir as pessoas a evitar o acúmulo de água parada, onde o Aedes procria. Mas alguns países suspenderam o esforço cedo demais. Quando o número de casos recuou, os políticos pararam de se preocupar. E os mosquitos voltaram, aos bilhões.

Contra-ataque. A campanha realizada há mais de cinquenta anos foi liderada pela Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), escritório regional da Organização Mundial da Saúde (OMS) nas Américas. Está na hora de a instituição mobilizar os governos da região para uma nova investida contra o mosquito. O Brasil está mobilizando seu Exército para realizar uma campanha de conscientização de porta em porta; outros países afetados deveriam fazer o mesmo. Nas nações mais pobres, a veiculação de mensagens informativas, a contratação de agentes de saúde, e a distribuição de repelentes, inseticidas e mosquiteiros poderiam ser financiados por meio de doações. Se a ideia é que não restem reservatórios virais, prontos para reemergir, é preciso agir em todo o território em que o zika está presente, assim como nos locais a que ele deve chegar em breve, como é o caso das áreas subtropicais dos EUA no Golfo do México.

Também é preciso direcionar mais recursos para pesquisas sobre novos métodos de eliminação do mosquito. As técnicas de modificação genética, que produzem mosquitos estéreis, mas ainda assim atraentes a fêmeas não modificadas, parecem promissoras. Testes realizados no Brasil indicam que a liberação em massa de mosquitos transgênicos dizima a população não modificada em questão de meses.

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Tais iniciativas serão dispendiosas. Entretanto, resultarão no controle de não apenas uma, mas várias doenças graves. Ainda que o Aedes aegypti não transmita a malária, os métodos empregados em sua erradicação também poderão ser usados no combate a seu portador, o Anopheles. É chegado o momento de lançar um novo contra-ataque aos mosquitos - e, desta vez, é preciso ir até o fim.

© 2015 THE ECONOMIST NEWSPAPER LIMITED. DIREITOS RESERVADOS. TRADUZIDO POR ALEXANDRE HUBNER, PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS ESTÁ EM WWW.ECONOMIST.COM.