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Greve de residentes prejudica consultas, cirurgias e atendimento no Hospital São Paulo

Categoria decidiu cruzar os braços por melhores condições de trabalho; 30% são mantidos em atendimentos de urgência

Por Felipe Resk
Atualização:

Atualizada às 17h47

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SÃO PAULO - A paralisação de médicos residentes obrigou o Hospital São Paulo a remarcar consultas, suspender cirurgias eletivas e restringir atendimento aos casos de emergência. A categoria, que representa um terço do quadro profissional da instituição, cruzou os braços nesta terça-feira, 23, por melhores condições de trabalho.

Atualmente, 1.100 residentes atuam no Hospital São Paulo, vinculado à Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Por causa da greve, apenas 30% desses profissionais foram mantidos trabalhando normalmente, para garantir atendimento aos pacientes do pronto-socorro e com risco de morte.

Usando muleta, a dona de casa Maria Conceição Barros, de 59 anos, que há dez anos faz tratamento por problemas de trombose venosa, saiu do hospital sem ser atendida. Segundo afirma, já passou por cinco cirurgias no próprio Hospital São Paulo em decorrência da doença, e faz consultas duas vezes por mês. Na unidade, acabou orientada a procurar um posto de saúde. "Sinto dores na perna e dificuldade para caminhar. Agora nem sei que rumo vou tomar", diz.

Viagem perdida. A bartender Lucineia Silva, de 38 anos, veio de São Bernardo do Campo, na Grande São Paulo, para acompanhar a mãe, Zulmira Sousa, de 78, que é cadeirante, em uma consulta com um neurologista. Para conseguir marcar o procedimento, Lucineia afirma que precisou varar uma madrugada na fila - isso há quatro meses. Nesta terça, recebeu a notícia de que só será atendida no dia 18 de setembro.

"Saímos às 5h de casa, com a minha mãe nessas condições. Ela é acamada, nem consegue falar direito. Precisamos da consulta para descobrir o que ela tem e iniciar um tratamento. Mas agora vamos ter de esperar mais ainda", conta. A bartender também afirma que a família não foi avisada sobre a greve dos residentes.

De ainda mais longe, veio a dona de casa Leia Ferreira, de 32 anos. De três em três meses, ela sai à meia-noite da região do Vale do Ribeira, onde mora, e viaja por mais de cinco horas até São Paulo. O esforço é por causa do filho, Caio, de seis anos, que sofre de problemas vasculares. Segundo conta, ele não pode se expor ao sol e precisa usar meias ortopédicas.

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Para enfrentar a viagem, traz cobertores e uma mochila com roupas limpas. O encontro com o ortopedista nesta terça, no entanto, precisou ser remarcado. A nova data disponível é só em novembro. "É triste, a gente que é mãe precisa cuidar bem do filho. Eu só tenho ele. Sem tratamento, a situação complica", diz. Desempregada, Leia afirma que o dinheiro é curto até para fazer refeição fora de casa. "Aqui tudo é caro e somos duas bocas para alimentar."

Greve. De acordo com Klaus Ficher, presidente da associação de residentes da Unifesp, a categoria reivindica melhores condições de trabalho para atender os pacientes. "Há muito tempo há pessoas internadas em corredores, falta medicação básica e o orçamento do hospital é deficitário", diz.

A associação estima que 95% da categoria tenha aderido à paralisação e reforça que o ato não tem como pleito reajuste salarial. Segundo Ficher, cerca de 4 mil atendimentos são feitos diariamente no ambulatório do hospital. O setor é um dos mais prejudicados pela paralisação e os pacientes tiveram de esperar horas para receber atendimento. 

Para o diretor do Sindicato dos Médicos de São Paulo (Simesp), Otelo Chino Junior, a paralisação é resultado de falta de financiamento. Na semana passada, o conselho gestor do hospital chegou a suspender as internações eletivas por falta de recursos. A Secretaria Estadual de Saúde e o Ministério da Educação (MEC) prometeram R$ 7 milhões, somados. De acordo com os grevistas, o repasse é suficiente para manter o hospital funcionando por apenas um mês.

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Junior afirma que em hospitais universitários, como é o caso do Hospital São Paulo, o papel do residente na assistência médica é "preponderante". "Ele é responsável por praticamente 70% do atendimento", diz. Favorável à paralisação, o diretor do Simesp diz que a falta de equipamentos básicos, como gaze e luva, além de medicações, torna o trabalho dos profissionais inseguro. "Infelizmente, a greve acaba sendo contra a população, que é o elo mais frágil do sistema."

Em nota, a direção do Hospital São Paulo afirma que "recebeu as reivindicações dos residentes e trabalha para que estas sejam atendidas". A instituição, no entanto, diz não ser possível avaliar o impacto da paralisação. Ainda de acordo com o comunicado, o hospital está "se esforçando para manter o atendimento à população" e "se houver necessidade, reforçará a equipe médica".

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