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Incidência de enfarte cai em homens e sobe em mulheres

Pesquisa do HCor mostra que o número geral de enfartados entre seus pacientes caiu 12% de 2009 para 2010, mas a população feminina está na contramão dessa tendência: entre elas houve aumento de 3,8% nos casos da doença

Por Isis Brum
Atualização:

O coração feminino é mais frágil que o do homens. E não se trata de romantismo. Pesquisa inédita do Hospital do Coração (HCor) de São Paulo mostra que o número de enfartes entre mulheres cresceu 3,8% de 2009 para 2010, enquanto houve queda de 17% no sexo masculino no mesmo período e de 12% na média geral. O fenômeno é multifatorial, dizem os médicos.

 

Homens resistem mais do que elas a problemas como diabete, hipertensão e obesidade, por exemplo, fatores de risco cardiovascular para ambos os sexos. Além disso, há ameaças exclusivamente femininas, como o uso da pílula anticoncepcional aliado ao tabaco, além de peculiaridades orgânicas, como o fato de a mulher ter artérias mais finas e sensíveis. Mas não é só.

 

 

Referência em saúde do coração, a American Heart Association (AHA) definiu neste ano novos fatores de risco para a saúde cardiovascular das mulheres. Doenças autoimunes, como lúpus e artrite reumatoide, complicações na gravidez - hipertensão e diabete gestacional - e depressão foram incluídas entre as ameaças para o sexo feminino.

 

 

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Os médicos lembram também que, na mulher, quadros de enfarte costumam ser confundidos com outros problemas de saúde. "Os sintomas, na mulher, são mais silenciosos", explica o cardiologista do HCor, César Jardim. "São associados à falta de ar, mal estar, desconforto e dores no estômago."

 

Não foi a clássica dor no peito que levou a dona de casa Valéria Alves de Oliveira, 44 anos, ao cardiologista. Uma forte dor no ombro esquerdo, confundida por ela com problemas de coluna, foi o sinal do problema cardiovascular. "Nunca pensei que pudesse ser um enfarte", diz Valéria. Apesar da surpresa, seu histórico carregava naquele momento vários fatores de risco: era diabética, fumante e sedentária (leia mais ao lado).

 

Na pesquisa do Hcor foram avaliados 201 pacientes enfartados em 2010, ante 228 em 2009. De acordo com Jardim, outro problema com relação à população feminina é a falta de atendimento adequado no pronto-socorro, já que os socorristas, segundo ele, suspeitam mais de enfarte em homens que em mulheres.

 

Chefe do laboratório de Biologia Molecular do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, órgão da Secretaria de Estado da Saúde (SES), Marcelo Ferraz Sampaio concorda. "Muitas vão para casa sem diagnóstico correto. Há um certo preconceito (no atendimento) e diferenças culturais importantes, pois a mulher demora mais para procurar ajuda", diz. "Ela cuida dos afazeres primeiro e, depois, pensa em ir ao médico."

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A própria natureza joga contra a mulher em relação às doenças cardiovasculares, a começar pelas artérias. "São mais estreitas e menos tolerantes ao álcool e ao cigarro, por exemplo", alerta Abrão José Cury, supervisor de Clínica Médica da Unifesp.

 

"Síndromes metabólicas, como obesidade, colesterol ruim, diabete e triglicérides elevados, afetam muito mais a mulher que o homem", completa o diretor da Sociedade de Cardiologia de São Paulo, Pedro Sílvio Farsky. Após a menopausa, quando a mulher perde estrogênio (hormônio feminino), fator de proteção cardiovascular, o risco cresce ainda mais.

 

Dor no braço: um aviso que costuma ser ignorado

 

A dor forte que ia do ombro esquerdo às pontas dos dedos era algo diferente de tudo que Valéria Alves de Oliveira já havia sentido em 39 anos de vida. "Nunca pensei que pudesse ser um enfarte."

 

Hoje, aos 44, cinco anos após ter feito um cateterismo, passado por uma angioplastia e ganhado uma hipertensão, Valéria mudou seus hábitos alimentares e de vida. "Quando você pensa que tem pessoas que podem ficar sem você, passa a ter medo", diz, referindo principalmente aos filhos, na época com 3 e 11 anos.

 

Embora o vício tenha sido abandonado, a alimentação esteja mais saudável e a ioga e caminhada tenham sido incorporadas à sua rotina, Valéria ainda sente medo de passar por tudo novamente. "A dor foi inesquecível."

 

A aposentada Esther Lopes, de 77 anos, também não esquece a dor forte que sentiu no braço esquerdo durante uma noite inteira em 2008. Quando chegou ao hospital, na manhã seguinte, ela se assustou ao ouvir o médico dizer: "a senhora está enfartando".

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"Meu marido gritava de dor no peito nas três vezes em que teve enfarte. Eu achava que para ter enfarte ia ser igual", conta, relembrando os apuros que passou para socorrê-lo. "Pensei que não ia mais ver meus filhos e netos."

 

O susto maior foi saber que, em seu caso, a doença estava "camuflada" e que havia tido um enfarte antes, sem saber. Com um stent (aparelho para desobstruir artérias) e sem abusar dos doces, Esther está mais atenta. "Na primeira vez eu escapei, na segunda fui parar na UTI, mas se não tomar cuidado, não escapo da terceira." / Verônica Dantas

 

 

Amamentar ajuda a proteger o coração materno

 

Amamentar por pelo menos um ano pode reduzir em 13% o risco de enfarte, segundo estudo do American Journal of Obstetrics & Gynecology. De acordo com a publicação, essa proteção pode chegar a 37% quando o tempo de aleitamento, consideradas todas as gestações, ultrapassa dois anos. O benefício foi observado em mulheres cujo último filho havia nascido até 30 anos antes.

 

A pesquisa, que avaliou 89.326 mulheres, todas mães, trouxe a primeira evidência de que o tempo acumulado de amamentação pode influenciar a saúde cardiovascular no longo prazo. Dessas mulheres, 63% já haviam amamentado.

 

Os pesquisadores levaram em consideração fatores como idade, número de partos, peso, história familiar, dieta e sedentarismo. Uma das hipóteses levantadas pelos especialistas é a de que a amamentação tenha um efeito antiestresse de longa duração, por conta da produção do hormônio oxitocina, que melhora a resposta ao estresse.

 

A mãe que amamenta também tem mais facilidade de recuperar o perfil metabólico que tinha antes da gravidez. Isso porque, durante a gestação, a quantidade de gordura visceral, a resistência à insulina e os níveis de lipídios e triglicérides aumentam, sobrecarregando o sistema cardiovascular da mãe.

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Referência mundial em saúde do coração, a American Heart Association (AHA) divulgou neste ano novas diretrizes para medir riscos cardiovasculares e apontou as mulheres como público mais vulnerável às doenças do coração. Entre os fatores estão:

 

 

 

 

 

O Hospital do Coração preparou uma lista de indicadores para uma boa saúde cardíaca

 

(como a corrida)

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