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Monólogos dominam cena teatral em São Paulo

'The Cachorro Manco Show', 'Mediano' e 'Happy Hour' se juntam aos muitos já em cartaz na cidade

Foto do author Ubiratan Brasil
Por Ubiratan Brasil e Beth Néspoli
Atualização:

"Eu poderia estar mordendo, atacando ou até dormindo aqui na sua frente, mas não, eu preferi ter um minuto de sua atenção. Ração por minha narração", propõe o cão vira-lata, ou mendigo ou o artista - figuras que perpassam o solo do ator Leandro Daniel Colombo, "The Cachorro Manco Show". Dirigido por Moacir Chaves, é mais um dos monólogos que iniciam temporada neste fim de semana e vêm se juntar aos muitos já em cartaz na cidade.

 

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Mas não se trata de estreia absoluta, ainda não testada diante do público. "The Cachorro Manco Show" vem de temporadas bem-sucedidas, no Rio e em Portugal, e tem texto de Fábio Mendes, premiado na 2ª edição do Prêmio Luso-Brasileiro de Dramaturgia "Antonio José Silva", promovido pelo Instituto Camões e pela Funarte. A proposta do concurso, disputado por dezenas de autores brasileiros e portugueses, era uma homenagem ao Pe. Antonio Vieira.

 

"Quanto mais bem estruturado o meu sermão, mais rápido eu durmo embaixo de um teto! Retórica, para mim, é questão de sobrevivência", diz o ator nesse solo de humor ora ácido, ora terno, que tem inserções de trechos dos sermões de Vieira.

 

Não dá para negar a força de argumentação da dramaturgia que faz o espectador não despregar olhos e ouvidos do ator, que ora é o cão do grego Ulisses, em Ítaca; ora o vira-lata de um político brasileiro corrupto. Todo o tempo ele transita por diferentes cães e seus donos ao longo da história. Artista paranaense integrante da Vigor Mortis, companhia que apresentou no Centro Cultural São Paulo ano passado o ótimo "Graphic", Colombo revela-se intérprete de muitos recursos, vocais e corporais, sem exibicionismo.

 

Mediano

 

Sentado atrás de uma mesa, Marco Antônio Pâmio é Zé Carlos, homem medíocre, carreirista político. Ao ficar em pé e juntar levemente as mãos, o ator se transforma - agora é a mãe de Zé Carlos, angustiada com a apatia do filho. Um passo ao lado e Pâmio vive o pai, homem orgulhoso por trair a mulher inúmeras vezes. O milagre da multiplicação é fruto do talento do ator, um dos trunfos do espetáculo "Mediano", monólogo que estreia nesta sexta, no Auditório do Sesc Pinheiros.

 

 

Em cena, Pâmio interpreta 16 personagens utilizando apenas um figurino, formado pelo conjunto terno e gravata. "Mediano" acompanha a trajetória de Zé Carlos, homem com um talento camaleônico para se adaptar a todas as situações. Assim, entre 1977 e 2007, ele se transforma: estudante sem ambição, funcionário em cargo público, assessor de senador, deputado, pastor. Em nenhum momento, porém, Zé Carlos se preocupa com a ética. "Trata-se de um Macunaíma da classe média brasileira", comenta o ator.

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E, ao longo daqueles 30 anos, a história política do Brasil serve como pano de fundo, desde a campanha das Diretas Já e a morte de Tancredo Neves, até o impeachment de Fernando Collor e os duplos mandatos presidenciais usufruídos tanto por Fernando Henrique Cardoso como por Lula.

 

Happy Hour

 

Juca de Oliveira é um homem indignado - com a corrupção política, com o trânsito caótico, com o descaso com a natureza. Tal revolta chega para público no formato de comédias com um forte viés político, como "Caixa 2" e "Às Favas com os Escrúpulos", todas de enorme sucesso. Como a ficção não foi suficiente para extravasar seu repúdio às mazelas da sociedade, Juca organizou um punhado de textos ainda não utilizados para formar "Happy Hour", monólogo que estreia nesta sexta, 24, para convidados, no Teatro Jaraguá.

 

Desta vez, não há uma história fictícia que serve de sustentação para diálogos mordazes - em cena como ele mesmo, Juca senta-se em um bar e, enquanto beberica, conversa com a plateia sobre problemas diversos, desde o engarrafamento monstro que marca o trânsito da cidade na véspera de feriados até o uso imoral de passagens aéreas pelos políticos brasileiros.

 

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"Toda peça que escrevo é sobre algo que me incomoda", conta ele, 74 anos de vida, 48 como ator. "Em 'Qualquer Gato Vira-Lata Tem uma Vida Sexual Melhor que a Nossa', por exemplo, foi a forma que encontrei para discutir problemas com a minha filha, que não me ouvia." O teatro, portanto, mais que a televisão e o cinema, tornou-se seu canal de comunicação mais certeiro. E, como está há tanto tempo nos palcos, Juca percebeu que a plateia tornou-se parte de sua família, daí a ideia de compartilhar pensamentos sobre as contradições do cotidiano.

 

O humor foi definido como linha mestra para que o texto não soasse excessivamente crítico. Apesar de já ter encenado monólogos antes, Juca terá pela primeira vez a experiência de manter um contato direto com a plateia que, incentivada, poderá reagir às provocações do ator.

 

The Cachorro Manco Show. 70 min. 14 anos. Sesc Paulista (65 lug.). Avenida Paulista, 119, 3179-3700. 6.ª a dom., 20h30. R$ 5 a R$ 20. Até 14/6.

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Mediano. Autor: Otávio Martins. Direção: Naum Alves de Souza. 60 min. 14 anos. Sesc Pinheiros. Auditório (101 lug.). Rua Paes Leme, 195, telefone 3095-9400. 6 ª, às 21 h; sáb., às 19h30. De R$ 3 a R$ 12. Até 6/6.

 

Happy Hour, com direção de Jô Soares. 60 min. 16 anos. Teatro Jaraguá. Rua Martins Fontes, 71, Centro, 3255-4380. 5.ª a sáb., 21h30; dom., 19 h. R$ 60. Até 12/7.

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