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Opinião|Sexo vale a pena?

Sexo é bom, mas dá trabalho. Os seres vivos que usam essa estratégia reprodutiva gastam muita energia. Precisam encontrar um par, competir por ele, fazer a corte, tudo para copular, e a cópula nem sempre garante a reprodução. Essas atividades dão tanto trabalho que provavelmente seriam abandonadas se não fossem garantidas por um instinto sexual fortíssimo e um grande prazer associado ao ato sexual. Em espécies como a nossa, até preliminares, como a procura do par e a corte, se transformaram em atos prazerosos. Tudo para garantir que a reprodução ocorra.

Atualização:

Mas existe a reprodução sem sexo, chamada de assexual. Alguns organismos, como bananas e bactérias, simplesmente crescem e se dividem. A vida fica mais simples, não precisam procurar um par e não gastam tanta energia nesse processo complicado chamado sexo. Basta produzir um broto ou se dividir ao meio. Se você acha isso estranho, lembre-se que todas as células que compõem seu corpo se reproduzem de maneira assexual, simplesmente se dividindo ao meio. As únicas que não seguem esse protocolo são os espermatozoides e óvulos.

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Aí vem a questão. Qual a vantagem auferida pelos seres vivos que praticam o sexo? Se ele custa tão caro, por que todos os seres vivos não se reproduzem de maneira assexual? Invertendo a pergunta, se o sexo é tão comum entre seres vivos, ele deve fornecer alguma vantagem evolutiva, senão já teria desaparecido. Que vantagem é essa?

Faz décadas que os teóricos da biologia propuseram uma explicação. Os organismos que praticam o sexo se adaptam mais rapidamente ao meio ambiente, e essa vantagem justifica o gasto extra. Isso ocorreria porque durante a reprodução sexuada os genes dos dois participantes são misturados. Além disso, na produção dos gametas (óvulos e espermatozoides) existe um processo que separa genes que se encontram próximos em um mesmo cromossoma, o que aumenta o número de combinações. Esse processo de mistura, que já é bem conhecido e comprovado, permitiria que as mutações benéficas fossem selecionadas mais rapidamente e as deletérias fossem descartadas. Nada disso ocorre no processo de reprodução assexuada.

Até agora, essa vantagem não passava de uma teoria. A novidade é que foi comprovada experimentalmente.

O experimento foi feito com o fungo que usamos para fazer cerveja e outras bebidas alcoólicas, o Saccharomyces cerevisiae. Esse fungo se reproduz de maneira sexuada ou assexuada, dependendo da situação. Os cientistas produziram uma população desse fungo. Metade foi colocada em condições que só permitia a reprodução assexuada e a outra foi liberada para praticar o sexo. Ambas as populações foram desafiadas a se adaptar a um mesmo ambiente. As populações foram acompanhadas por 3 mil gerações. Seria o equivalente a acompanharmos uma população humana por 75 mil anos (assumindo que a duração de uma geração entre humanos é de 25 anos).

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Ao longo dessas 3 mil gerações os cientistas foram analisando o que acontecia com as novas mutações que apareciam nas duas populações. Para isso, o genoma das populações foi analisado ao longo do tempo. O resultado demonstrou que novas mutações, boas e más, surgiram com a mesma frequência em ambas as populações, mas ao longo do tempo as mutações boas se espalharam mais rapidamente na população que praticava o sexo e mais lentamente na população assexual. As mutações prejudiciais se mantiveram por mais tempo na população assexual e foram eliminadas pela seleção natural mais rapidamente nas populações de reprodução sexuada.

Esse resultado demonstra que o processo de seleção natural ocorre mais rapidamente em populações que usam a reprodução sexuada. É como se o sexo acelerasse a evolução.

Se a reprodução sexuada não tivesse surgido, o processo de seleção natural seria muito mais lento. Seguramente não estaríamos aqui descobrindo que o sexo não só é bom, mas acelera nossa capacidade de adaptação a novos ambientes. E essa é uma vantagem que supera de longe a energia gasta na prática da reprodução sexuada. Pense nisso na próxima vez que achar que dá muito trabalho ter uma vida sexualmente ativa.

Opinião por Fernando Reinach
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