Vírus acelerou técnicas inéditas de imunização

Imunizantes que usam RNA mensageiro passaram no teste de eficiência e segurança

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Por Redação
Atualização:
Coronavírus acelerou o desenvolvimento das vacinas de RNA Foto Getty Images 

Há 225 anos, o médico britânico Edward Jenner desenvolveu a primeira vacina do mundo. Ele descobriu que pessoas expostas a uma versão bovina do vírus da varíola tinham inicialmente reações leves e desenvolviam imunidade contra a variedade humana da doença. A técnica ganhou o nome de vaccination (vacinação), que vem da palavra “vacca” em latim. De lá pra cá, com os avanços da ciência, novas técnicas surgiram. As vacinas passaram a ser feitas com agentes infecciosos mortos, enfraquecidos em laboratórios ou até com pequenos pedaços de micro-organismos nocivos ao homem.

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A urgência provocada pela , entretanto, fez maturar o uso das vacinas de RNA mensageiro (mRNA), que estavam sendo pesquisadas há muitos anos em várias partes do mundo. Em síntese, é um imunizante estruturado em uma sequência de RNA que, dentro das células, vai provocar a síntese de uma proteína específica do vírus que se quer combater. Ou seja, essa molécula vai treinar o sistema imunológico a reconhecer o inimigo. Quando finalmente ele chegar, haverá um exército celular pronto para o combate. 

“É uma vacina com uma tecnologia completamente nova, diferente de se utilizar, por exemplo, um vírus inativado ou uma partícula viral”, explica Alberto Chebabo, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia e diretor clínico do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (UFRJ). Esta é a primeira vez que essa tecnologia é ofertada em grande escala ao mercado.

A vacina da farmacêutica Pfizer, em parceria com a empresa alemã BioNTech, demonstrou uma taxa de eficácia de 95%, e a da americana Moderna, 94,1%. Atualmente, essas são as duas opções aprovadas para uso contra a covid-19 em países como Reino Unido, EUA, Israel e Brasil. Apesar de estar funcionando, a técnica apresenta uma dificuldade logística. Os imunizantes precisam ser armazenados em locais com baixa temperatura, pois as moléculas de mRNA se desintegram rapidamente quando expostas à temperatura ambiente.

No caso da Pfizer/BioNTech, os termômetros dos freezers precisam funcionar entre -90 ºC e -60 ºC para estocar as vacinas por até seis meses. Para que fosse possível o transporte entre diferentes países, as fabricantes desenvolveram uma embalagem à base de gelo seco. No caso da Moderna, a temperatura necessária é -20 ºC, o que possibilita uma logística um pouco menos complicada.

Outro ponto fundamental, em se tratando de novas técnicas de vacinação, é a segurança. Mas as aplicações de mRNA também estão passando pelo teste. “Existem poucos eventos adversos, basicamente locais e sistêmicos, como febre e dor no corpo, que duram em torno de 24 a 48 horas após a aplicação da vacina. Vimos alguns casos como risco aumentado de miocardite em adultos jovens, principalmente adolescentes, mas foram quadros muito leves, sem repercussão clínica importante e sem o risco de morte associado. Ou seja, mesmo eventos adversos que são considerados mais graves não significam riscos de complicações ou de óbito”, explica Chebabo.

Apesar de surgir como uma grande novidade para a sociedade, as vacinas de mRNA vêm sendo desenvolvidas desde os anos 1990. O fato de o mundo ter sido assolado por uma fez com que todas as possibilidades fossem desenvolvidas e testadas com maior rapidez. Em condições normais, as obtenções de autorizações e o recrutamento dos pacientes costumam levar bem mais tempo. Além disso, existe um alto custo para a realização das fases clínicas, que chegam a envolver dezenas de milhares de voluntários.

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Desde 2018, a Pfizer e a BioNTech estavam aprimorando uma plataforma vacinal de mRNA para produzir imunizantes contra o Influenza (gripe). Tecnologia que, rapidamente, se virou para o combate ao coronavírus.

“Houve uma força-tarefa das principais indústrias e laboratórios para que seus profissionais se dedicassem ao desenvolvimento de terapias e de medidas preventivas para a covid-19. E as adaptações na forma como as informações foram sendo passadas para a análise das agências regulatórias que possibilitaram que os prazos, anteriormente de anos, pudessem ser encurtados colaboraram para que as vacinas pudessem chegar mais rapidamente ao braço da população”, explica Julia Spinardi, líder médica da área de vacinas da Pfizer.

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