Um terço das ações contra planos de saúde é de idosos

Embora representem 12,5% dos clientes, eles vêm buscando mais a Justiça; cobertura e preço de mensalidade estão entre reclamações

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Por Fabana Cambricoli
Atualização:

SÃO PAULO - Embora os idosos representem apenas 12,5% dos clientes de convênios médicos, eles são responsáveis por 31% das ações judiciais contra planos de saúde coletivos, revela estudo da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) que analisou 4 mil processos movidos na capital entre 2013 e 2014.

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Negativa de cobertura, reajustes de mensalidade e problemas em planos empresariais após a aposentadoria são algumas das principais reclamações dos clientes ao Judiciário.

Para Mário Scheffer, professor do Departamento de Medicina Preventiva da FMUSP e coordenador do estudo, o alto número de ações movidas por idosos demonstra que a regulação do setor de planos de saúde não é suficiente para proteger esse grupo etário. “Esse modelo de saúde suplementar não é adequado para o envelhecimento da população. É um mercado que tende a afastar ou excluir esses idosos por meio de reajustes abusivos ou até do cancelamento dos planos quando a pessoa começa a ficar doente. E aí entra uma omissão da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) ao permitir isso”, diz.

Ao completar 70 anos, mensalidade de Piccirillo passou de R$ 727 para R$ 1.100 Foto: DANIEL TEIXEIRA/ESTADAO

O especialista ressalta que, com a queda do número de operadoras que comercializam planos individuais, os idosos têm contratado cada vez mais planos coletivos por adesão, modalidade em que o índice de reajuste não é limitado pela ANS e cujo contrato pode ser cancelado pela operadora. “É necessária uma fiscalização mais a favor dos direitos dos usuários”, defende Scheffer.

Dinheiro. Foi por causa de um reajuste de mensalidade que o aposentado Domingos Piccirillo Netto, de 75 anos, resolveu entrar na Justiça contra seu plano de saúde. Ao completar 70 anos, a mensalidade do convênio passou de R$ 727 para quase R$ 1.100, alta de 51%. “Era muito dinheiro, ia ficar muito pesado para pagar. Entrei com o pedido e o juiz deferiu a liminar na mesma semana, mantendo o preço, mas a operadora recorreu e o processo ainda está correndo até hoje”, conta.

Advogado do escritório Vilhena Silva, Rafael Robba explica que a resolução da ANS que regula o reajuste por faixa etária é muito ampla e não garante proteção ao consumidor. “Pela resolução, o reajuste para a última faixa etária não pode ser mais do que seis vezes superior ao da primeira faixa etária, mas isso já é muito. Há casos de operadoras que aplicam reajuste de 100%”, afirma. A ANS diz que, em caso de dúvidas quanto aos porcentuais de reajuste, o consumidor pode contatar a agência, que aplica multas se houver irregularidades ou abusos.

Processos quintuplicaram no Estado em 5 anos

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Em cinco anos, o número de ações judiciais contra planos de saúde quintuplicou em São Paulo, segundo o estudo da FMUSP. Ao levantar todos os processos contra operadoras no Estado, os pesquisadores verificaram que o número de ações julgadas em segunda instância passou de 2.294, em 2010, para 11.480 em 2015, alta de 400%. A alta foi muito superior ao índice de crescimento de clientes de planos de saúde no Estado. No mesmo período, passou de 17,3 milhões para 18,3 milhões o número de beneficiários, avanço de 5%.

Coordenador do estudo, o professor da FMUSP Mário Scheffer afirma que o excesso de processos contra planos mostra a fragilidade do sistema de saúde privado no respeito aos direitos do consumidor. “É um sinal de continuidade de práticas abusivas por parte das empresas.”

Para o especialista, deveria haver um diálogo maior entre a Agência Nacional de Saúde Suplementar e o Judiciário. “Seria importante aprimorar a atividade regulatória ao aproximá-la um pouco da interpretação da Justiça. Se a maioria das decisões dá ganho de causa para o consumidor, a ANS tem de estar atenta a isso”, afirma.

Sobre o excesso de ações, principalmente entre idosos, a Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge) diz que aguardará a publicação do estudo para entender a metodologia e diz que os beneficiários maiores de 59 anos fazem mais 40,1% de consultas, 76,8% de exames, 96,7% de internações e 110,1% de terapias do que as demais faixas etárias.

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