7,8 milhões vivem distantes 4 horas de UTIs para covid-19

Aceleração da epidemia ocorre em direção ao interior, onde há falta de estrutura para casos complexos

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Por Giovana Girardi
Atualização:

Pelo menos 7,8 milhões de brasileiros vivem em locais que demandam viagens de 4 horas até uma cidade que tenha condições de oferecer tratamento adequado para os casos mais complexos de covid-19, como hospitais com Unidade de Terapia Intensiva (UTI), respiradores e equipes especializadas em doenças respiratórias agudas e graves. 

É o que revela uma análise divulgada nesta quarta-feira, 20, pelo Instituto de Comunicação e Informação em Saúde, da Fiocruz. O dado expõe o risco às populações mais vulneráveis e o tamanho das dificuldades que serão impostas aos sistemas de saúde com a interiorização da doença. Segundo dados do Ministério da Saúde referentes à quarta-feira, 3.488 municípios, em todo o País, já foram afetados pelo coronavírus, ou 62,6%.

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Pesquisadores do grupo MonitoraCovid-19 divulgaram nota técnica sobre as regiões do País e as redes de saúde, avaliando o deslocamento da covid-19 pelo País e o fluxo de pacientes em busca de internação. 

Somente na semana passada (entre os dias 9 e 16), 227 municípios com população menor que 10 mil habitantes apresentaram o primeiro caso da doença, assim como 197 municípios com população entre 10 e 20 mil habitantes e 112 municípios com população entre 20 e 50 mil habitantes.

As mortes também começaram a ocorrer nessas cidades. De acordo com o levantamento, 50 municípios com menos de 10 mil habitantes apresentaram mortes pela primeira vez. O mesmo ocorreu em 83 municípios com população entre 10 e 20 mil habitantes e em 98 municípios com população entre 20 e 50 mil habitantes.

A chegada da doença a cidades tão pequenas acende o alerta sobre como vai ser o acesso dos moradores desses locais às redes de saúde em situações de emergências. Pelos cálculos, os Estados mais afetados são Amazonas, Pará e Mato Grosso. Os três têm mais de 20% de suas populações vivendo em áreas das quase 8 milhões de pessoas que vivem distantes até quatro horas de um polo de atendimento de alta complexidade. 

O trabalho apontou ainda que em 175 municípiosonde há esses polos de atendimento, mais de 50% dos internados já eram provenientes de outros municípios até o dia 4 de maio.

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Redes de saúde

A análise teve como foco avaliar a sobrecarga das redes de saúde e indica que não adianta fazer isolamentos localizados, de um ou de outro município, sem pensar nas regiões como um todo, uma vez que as pessoas precisam se deslocar para buscar atendimento.

“Desde o começo da epidemia se fala na necessidade de proteger os sistemas de saúde. De achatar a curva para evitar o colapso. Mas é preciso entender de que sistemas estamos falando. Os moradores de municípios pequenos precisam se deslocar para os grandes para terem atendimento. Nesse sentido existem regiões de saúde pelo País”, explica Diego Xavier, epidemiologista do Instituto de Comunicação e Informação em Saúde da Fiocruz, que participou do trabalho. 

“O que sugerimos é que precisa ser adotada uma coordenação de estratégias para definir de modo claro e rápido qual região e qual rede está sendo protegida com uma determinada estratégia. Tem de ser uma união real, e não retórica”, diz.

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“Prefeitos têm de sentar com governadores e o governo federal para definir isso pensando nessas regiões de atendimento. Imagine uma região como a de Petrolina (PE) e Juazeiro (BA) (cidades separadas pelo Rio São Francisco). Se um Estado resolve aumentar o isolamento e o outro começar a relaxar, não vai dar certo”, complementa o pesquisador. “O que precisamos é proteger a rede de UTIs e respiradores e isso vai além dos limites municipais.”

O estudo alerta ainda que a doença, que começou pelas grandes capitais e de lá foi para o interior, agora vai fazer o caminho contrário na busca de doentes por atendimento. 

“Essa doença teve o tempo de ida e nas próximas semanas vamos começar a ver o tempo de volta. Só que as grandes cidades já estão com seus hospitais quase lotados. O isolamento que as cidades grandes adotaram no começo da epidemia fez com que a doença demorasse para chegar ao interior. E agora vamos ver as pessoas dessas cidades indo para as capitais em busca de atendimento”, diz Xavier.

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Profissionais de saúde cuidam de paciente com covid-19 na UTI do Hospital São Luiz Jabaquara Foto: Tiago Queiroz/ Estadão

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