11 de março de 2021 | 10h00
*Depoimento de Valéria Angelim, de 39 anos, que foi hospitalizada no Amazonas.
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“Com todos os cuidados possíveis, uso de máscara sempre, minha irmã, que trabalha como psicóloga num posto de saúde, pegou covid entre a primeira e segunda dose da vacina. Ela, contudo, estava assintomática e acabamos, minha mãe e eu, nos contaminando. E somos todas saudáveis, sem nenhuma comorbidade.
A primeira providência depois de saber que nós três, adultas, estávamos contaminadas foi enviar minhas sobrinha, de 11 anos, testada e negativa para covid, para a casa de uma amiga até que nós três estivéssemos bem. No começo da doença, eu era a mais bem disposta, fiquei cuidando da minha mãe e da minha irmã, que estavam com tosse, dor no corpo, febre, enquanto eu ‘só’ sentia dor nas costas, por uns três dias.
A dor estava cada vez pior, na verdade, mas eu estava de licença do trabalho por conta da doença e pensava que, quando acabasse, se elas ainda estivessem doentes, eu ficaria muito culpada. Só que a dor foi piorando, e a tosse também. Estávamos todas medicadas, inclusive com ivermectina, passada pelo médico. E como a gente vai dizer que não vai tomar um medicamento prescrito? (O uso de ivermectina não tem eficácia comprovada contra a covid-19. A fabricante do remédio não recomenda a prescrição em casos de covid-19)
Quatro dias de dor intensa nas costas fui ao posto e, de lá, já fui transferida para o Hospital Delphina Aziz (unidade de referência contra a covid-19 em Manaus), com oxigênio no rosto, pulmões brancos na tomografia e saturação de 79%. Fiquei muito assustada, tive uma crise de pânico, afinal tinha ido só para uma troca de medicação por conta das dores.
Tiraram minhas roupas, colocaram bata e fralda e a orientação era me mexer o mínimo para não piorar a saturação. Meu pavor era ser entubada, eu obedecia tudo, não me mexia, mas mesmo assim fiquei mais de dez dias sendo pronada (quando o paciente fica de bruços) diversas vezes. É uma sensação muito triste, ficar olhando para o chão ou para o lado, imóvel.
Por mais que você fique muito sonolenta pelos medicamentos, perca totalmente a noção do tempo, com aqueles bips do semi-intensivo, a angústia de estar ali, sozinha, com oxigênio no rosto o tempo todo, no soro, é incessante. Quando fui sozinha a primeira vez ao banheiro, já quase para ter alta, eu chorei. Ficar dias parada com pavor de piorar mais ainda e ser entubada só entende quem passou: é paralisada mesmo, porque ao pequeno esforço, a saturação baixava.
Mas enfermeiros e médicos foram muito humanos, durante todos os 15 dias que fiquei internada, e só soube quando recebi alta, que foi esse tempo todo. Se não fosse esse acalanto dos médicos e enfermeiros, sempre dando força para mim e aos pacientes ao redor, não sei o que seria de mim.”
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