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A BA.5, a nova subvariante da Ômicron, aumenta risco de reinfecção?

Velocidade de contágio da nova versão do coronavírus assusta, mas especialistas refutam possibilidade de uma contaminação nova a cada duas ou três semanas

Por Joel Achenbach
Atualização:

A mais recente ramificação da Ômicron, a BA.5, rapidamente se tornou dominante nos Estados Unidos e, graças à sua capacidade de escapar do sistema imunológico humano, está gerando uma onda de casos em todo o país.

O tamanho dessa onda não está claro, porque a maioria das pessoas está testando em casa ou não está testando. O Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) relatou na semana passada pouco mais de 100 mil novos casos por dia, em média. Mas especialistas em doenças infecciosas sabem que esses dados estão subestimando o número de verdade, que pode chegar a 1 milhão, disse Eric Topol, professor da Scripps Research que acompanha de perto as tendências da pandemia.

Nova variante preocupa pela velocidade de contaminação Foto: REUTERS/Octavio Jones

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Anticorpos de vacinas e infecções por covid anteriores oferecem proteção limitada contra a BA.5, o que leva Topol a chamá-la de “a pior versão do vírus que já vimos”. Outros especialistas apontam que, apesar de vir sendo atingido por várias rodadas de subvariantes da Ômicron cada vez mais contagiosas, os Estados Unidos ainda não viram um aumento dramático nas hospitalizações. Cerca de 38 mil pessoas estavam hospitalizadas com covid em todo o país até sexta-feira, segundo dados compilados pelo jornal Washington Post.

Esse número vem aumentando constantemente desde o início de março, mas permanece muito abaixo do recorde de 162 mil pacientes hospitalizados com covid em meados de janeiro. Na sexta-feira o número médio diário de mortes estava em 329 e não mudou significativamente nos últimos dois meses.

Entre os especialistas em doenças infecciosas existe um amplo consenso de que este continua sendo um vírus perigoso, que causa doenças de gravidade imprevisível – e eles dizem que o país não está fazendo o suficiente para limitar a transmissão.

As restrições e quarentenas já se foram há muito tempo. As viagens aéreas estão quase de volta aos níveis pré-pandemia. Os líderes políticos não estão falando sobre o vírus – é praticamente um “não tema” na campanha eleitoral. A maioria das pessoas parou de usar máscara, esqueceu o distanciamento social e acha que a pandemia acabou. Elas estão se arriscando com o vírus.

“Parece um faroeste”, disse Ziyad Al-Aly, epidemiologista da Universidade de Washington em St. Louis. “Não vemos nenhuma medida de saúde pública. Estamos em um ponto muito peculiar, onde o risco existe e está forte, mas baixamos a guarda e escolhemos, deliberadamente, ficar expostos e mais vulneráveis”.

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Angela Rasmussen, virologista da Universidade de Saskatchewan, gostaria de ver mais dinheiro para testes e desenvolvimento de vacinas, bem como mensagens mais fortes do governo Biden e das principais autoridades de saúde. Ela ficou consternada recentemente durante uma viagem ao sul da Califórnia, onde viu poucas pessoas usando máscaras no aeroporto. “É o que acontece quando políticos e líderes não assumem uma posição forte sobre o tema”, disse ela.

O CDC disse que pediu às pessoas que monitorem a transmissão na comunidade, “mantenham-se atualizadas sobre as vacinas e tomem as precauções apropriadas para proteger a si mesmas e às outras”.

Quase um terço da população americana vive em condados que o CDC hoje classifica como de “altos” níveis de transmissão. Os casos estão aumentando especialmente no Sul e no Oeste.

Muitas pessoas agora veem a pandemia como parte da vida moderna, e não como uma grave emergência de saúde. Parte disso é simplesmente uma recalibração generalizada do risco. Não estamos mais na primavera de 2020. Quase todas as pessoas já foram expostas ao vírus. Elas ainda podem ser infectadas, mas o sistema imunológico – preparado por vacinas ou ataques anteriores do vírus – geralmente tem camadas mais profundas de defesa que previnem doenças graves.

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Mas a taxa de mortalidade por covid-19 ainda está muito maior do que a mortalidade por gripe ou outras doenças contagiosas. As autoridades alertam para uma possível onda de outono ou inverno – talvez até 100 milhões de infecções nos Estados Unidos – que poderia inundar hospitais com pacientes de covid. Além do sofrimento direto de um surto tão grande, pode haver distúrbios econômicos, pois dezenas de milhões de pessoas ficam doentes demais para trabalhar.

“Parece que todo mundo esqueceu”, disse Mercedes Carnethon, epidemiologista da Escola de Medicina Feinberg da Universidade Northwestern.

Carnethon disse que ela também não está tão cautelosa quanto antes. Ela usa uma máscara de alta qualidade nos aviões, mas não na academia. Tem medo de contrair covid novamente – ela pegou durante a onda Ômicron no inverno passado. Mas não acha plausível uma estratégia de “covid zero”.

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“Sinto que não há muito que eu possa fazer no plano individual, além de parar minha vida”, disse Carnethon. “É arriscado. Vou pegar covid em algum momento inconveniente. Espero que seja mais leve do que a primeira vez que peguei”.

Muitos especialistas preocupados com a transmissão contínua também se opuseram ao pânico que se dissemina online e aos alertas apocalípticos sobre o vírus; as pessoas não estão sendo infectadas a cada duas ou três semanas, disse Rasmussen.

A imunidade populacional é uma das razões pelas quais o vírus continua mutando. O risco de reinfecções aumentou porque as subvariantes que surgiram recentemente são mais capazes de escapar da linha de frente do sistema imunológico e, essencialmente, não há esforço para limitar a transmissão no nível da comunidade.

Al-Aly, que também é chefe de pesquisa e desenvolvimento do Sistema de Saúde para Veteranos de St. Louis, vasculhou o vasto banco de dados do sistema para ver o que aconteceu com os quase 39 mil pacientes infectados com o coronavírus pela segunda ou terceira vez. O que ele encontrou foi preocupante. Em um artigo publicado online no mês passado, mas ainda não revisado por pares nem publicado em periódico científico, Al-Aly e seus colegas relataram que pessoas com infecções múltiplas têm um risco acumulado de doença grave ou morte.

Não é que as doenças posteriores sejam piores nem mesmo tão ruins quanto os casos anteriores. Mas qualquer infecção por coronavírus traz riscos, e o risco de um resultado muito ruim – um ataque cardíaco, por exemplo – se acumula à medida que as infecções se multiplicam.

A reinfecção aumenta o risco”, disse ele. “É como se você ficasse jogando roleta russa várias vezes seguidas”.

A vacinação continua sendo uma arma importante, embora ainda subutilizada, contra o vírus – mesmo que não seja tão eficaz para impedir novas infecções.

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No inverno passado, a Ômicron varreu uma população amplamente vacinada com uma facilidade impressionante e, desde então, as subvariantes chegaram em rápida sucessão, começando com a BA.2 e a BA.2.12.1, na primavera, e agora a BA.5 e sua parente quase idêntica, a BA.4.

As vacinas foram feitas a partir da cepa original do vírus que surgiu em Wuhan, China, no final de 2019. A agência sanitária americana (FDA) pediu aos fabricantes de vacinas que apresentassem novas fórmulas direcionadas a BA.5 e a BA.4. Esses reforços podem ficar prontos neste outono.

Mas não há garantia de que essas últimas subvariantes ainda serão dominantes daqui a quatro ou cinco meses. O vírus está evoluindo – e a uma velocidade notável. O vírus pode continuar superando as vacinas.

“Minha preocupação é: quando tivermos uma vacina para a BA.5, já teremos uma variante BA.6 ou um BA.7. O vírus continua correndo mais rápido do que nós”, disse Al-Aly.

“Estamos em uma posição muito difícil em relação à escolha da vacina para o outono, porque estamos lidando com um alvo notoriamente móvel”, Anthony Fauci, principal conselheiro do presidente Joe Biden para a pandemia, disse ao Post em junho, alguns dias antes de anunciar que também ele estava doente por causa do vírus.

Já existe outra subvariante Ômicron que chamou a atenção dos virologistas: a BA.2.75. Detectada pela primeira vez no mês passado na Índia, foi identificada em vários outros países, incluindo os Estados Unidos. Mas é muito cedo para saber se ela vai superar a BA.5 como variante dominante.

Não há evidências de que as novas formas do vírus resultem em diferentes sintomas ou gravidade da doença. A Ômicron e suas muitas ramificações – incluindo a BA.5 – normalmente se replicam mais alto no trato respiratório do que as formas anteriores do vírus. Esta é uma teoria de por que a Ômicron parecia menos propensa a causar doenças graves.

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Também não está claro se essas novas variantes alterarão o risco de uma pessoa contrair os sintomas de longa duração geralmente conhecidos como “covid longa”. A porcentagem de pessoas com sintomas severamente debilitantes está entre 1% e 5% – chegando a milhões de pessoas neste país, de acordo com Harlan Krumholz, professor de medicina da Universidade de Yale.

Sua colega, Akiko Iwasaki, professora de imunologia e especialista em covid longa, disse por e-mail que acredita que o mundo não está mais vigilante o suficiente. Muitas vezes, ela é a única pessoa de máscara na multidão, disse ela.

“Entendo o cansaço da pandemia, mas o vírus não foi embora”, disse ela. “Temo que o comportamento humano atual esteja levando a que mais pessoas se infectem e contraiam covid. E temo que essa situação possa levar a um grande número de pessoas com deficiência e problemas crônicos de saúde no futuro”.

A natureza do vírus faz com que os especialistas em doenças infecciosas evitem prever a próxima fase da pandemia. Topol adverte que um novo lote de variantes pode surgir do nada, da mesma forma que a Ômicron surgiu inesperadamente em novembro passado, com uma coleção de mutações. Não se conhece a origem precisa da Ômicron, mas uma das principais teorias é que ela evoluiu dentro de um paciente imunocomprometido com uma infecção persistente.

“Podemos ver uma nova família de letras gregas como a Ômicron, inevitavelmente”, disse Topol. “Ainda há espaço para esse vírus evoluir. Ele vem evoluindo de maneira acelerada há meses. Então podemos contar com isso”. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

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