Bactéria da sífilis veio da América mas evoluiu na Europa

Primeira epidemia da doença registrada na história ocorreu no velho continente em 1495

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Por Carlos Orsi
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A primeira epidemia de sífilis registrada na história ocorreu na Europa em 1495, e muitos pesquisadores acreditam que a doença chegou ao velho continente vinda da América, descoberta por Cristóvão Colombo em 1492. Agora, um novo estudo sugere que a bactéria realmente partiu do Novo Mundo, mas só deu origem à doença sexualmente transmissível ao se adaptar às condições européias.   "A teoria é de que, depois de se mudar de um clima quente e úmido, onde poucas roupas eram necessárias, para um clima quente, onde as pessoas usavam muitas roupas e se juntavam em grandes cidades com diferentes redes sexuais, teria havido uma tremenda pressão por um novo modo de transmissão" do micróbio, explica Kristin Harper, da Universidade Emory (EUA), principal autora do trabalho.   O estudo compara geneticamente diversas variedades da bactéria treponema, uma família que inclui, além do agente causador da sífilis, organismos responsáveis por outras moléstias que não são sexualmente transmissíveis.   Depois de analisar geneticamente 26 tipos de treponema causadores de doenças, a equipe de Kristin montou uma árvore genealógica da sífilis e concluiu que a versão sexualmente transmissível da bactéria é a mais recente, e tem como parentes mais próximas versões sul-americanas causadoras de uma doença conhecida como bouba ou framboesia, que surge sob a forma de lesões na pele.   Por conta disso, há uma boa chance de que os viajantes europeus que levaram a doença para a Europa não tenham adquirido a bactéria por via sexual, diz a pesquisadora. "Não podemos garantir se a infecção que os europeus pegaram era ou não venérea", afirma ela. "Os exploradores podem ter pego a bactéria em qualquer tipo de contato de pele com uma pessoa com lesões ativas".   Na base da árvore genealógica da bactéria, no entanto, está uma variedade de treponema natural do Velho Mundo. A teoria mais plausível, segundo Kristin, é de que a bactéria chegou ao continente americano junto com a humanidade, há milhares de anos.   "Nosso artigo mostra que as mudanças que tornaram a doença mais parecida com a sífilis começaram a emergir nas doenças de treponema à medida que a bactéria saía da África, rumo ao Oriente Médio e sul da Europa", diz ela. "Isso apóia a idéia de que o agente patogênico foi, com os primeiros colonizadores, para o Novo Mundo".   O trabalho será publicado nesta terça-feira, 15, no periódico PLoS Neglected Tropical Diseases, e estará disponível gratuitamente na internet.   Para Kristin, o mesmo processo que teria levado à transformação da bouba em sífilis - evolução desencadeada pelo isolamento de uma bactéria em um ambiente novo - pode estar em curso no mundo atual. "Um exemplo são as cepas de tuberculose extremamente resistentes a drogas que vemos hoje em partes da África do Sul", acredita. "Essas bactérias estavam essencialmente isoladas em um ambiente diferente, onde muitos antibióticos estavam sendo usados, e se adaptaram rapidamente para sobreviver".

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