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Bolsonaro distorce documento e sugere falsa tentativa de legalizar o aborto

Texto que incomodou o presidente é uma nota técnica sobre acesso à saúde sexual e saúde reprodutiva na pandemia

Por Mateus Vargas
Atualização:

BRASÍLIA - Minutos antes da divulgação sobre o registro de 1.349 mortos pela covid-19 em 24 horas, número recorde para o Brasil, o presidente Jair Bolsonaro foi às redes sociais na noite de quarta-feira, 4, afirmar que o Ministério da Saúde estava atrás de autores de uma "minuta de portaria apócrifa sobre aborto". Nas publicações, o presidente ainda afirmou ser contra interrupção de uma gravidez. O texto que incomodou o presidente, no entanto, é uma nota técnica sobre acesso à saúde sexual e saúde reprodutiva durante a pandemia. O documento não defende a legalização do aborto.

O presidente da República, Jair Bolsonaro 

O Ministério da Saúde, na nota, orienta, entre outros pontos, para a manutenção de procedimentos de aborto legal, que só são autorizados em três situações: quando a gravidez é resultado de estupro, se não há outro meio de salvar a vida da gestante e em casos de fetos com anencefalia. Divulgada de forma distorcida por sites de apoiadores de Bolsonaro, o documento também não é apócrifo, mas assinado por técnicos da Saúde. Notas técnicas deste tipo servem para orientar serviços de saúde distribuídos pelo Brasil. Procurado, o ministério disse que o documento foi "indevidamente veiculado" e ainda não havia sido aprovado pela Secretaria de Atenção Primária (SAPS). "Desta forma, a referida minuta não possui legitimidade desta Secretaria e o assunto em comento não foi discutido no âmbito do Ministério da Saúde." O Estadão apurou que a orientação do ministério deve ser revogada por pressão do presidente Jair Bolsonaro. A nota aponta "preocupação com o incremento significativo nas taxas de morbidade e mortalidade materna nos 26 Estados e no Distrito Federal" durante a pandemia, além do aumento de casos de violência contra a mulher. "Como consequência pode-se esperar o aumento de gravidezes indesejadas resultantes de relação sexual forçada. O acesso em tempo oportuno à contracepção de emergência deve ser pensado de modo a responder a esta necessidade das mulheres", diz a equipe da Saúde. O documento reforça ações "já previstas" pelo governo sobre saúde das mulheres e faz recomendações como monitorar estoques de métodos contraceptivos, capacitar equipes contra violência sexual e "reiterar a continuidade dos serviços de assistência aos casos de violência sexual e aborto legal." Procurado, o Palácio do Planalto não se manifestou.

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