Capital concentra um terço dos tumores de mama de SP

Estilo de vida explica o risco aumentado para a doença, que é de 90 ocorrências por 100 mil mulheres na metrópole e cai para 68 por 100 mil no Estado

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Por Tatiana Piva
Atualização:

SÃO PAULO - São esperados para este ano 5.760 novos casos de câncer de mama na capital, mais de um terço do total estimado para o Estado de São Paulo, que é de 15.080. Trata-se de um número que não se explica simplesmente pelo tamanho da população. Quando se considera a incidência esperada para cada 100 mil mulheres, por exemplo, as taxas relativas à cidade também são bem superiores aos números estaduais. Por aqui há um risco estimado de 89,91 casos a cada 100 mil mulheres, número que cai para 68,04 no Estado.

 

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Os dados são do último levantamento do Instituto Nacional do Câncer (Inca), chamado Estimativas 2010: Incidência de Câncer no Brasil, que traz informações de referência para os anos 2010 e 2011. Neste contexto, a região Sudeste surge como o local do País onde o câncer de mama é o tipo de neoplasia mais incidente entre as mulheres, com um risco médio estimado de 65 casos novos por 100 mil.

 

A situação da cidade não reflete apenas possíveis melhorias nas condições de diagnóstico em relação ao interior paulista: a maioria das outras neoplasias tem taxas semelhantes por 100 mil habitantes para capital e Estado: 5, 88 a 5,08, respectivamente, no caso da leucemia; 17,57 a 14,37 em relação ao câncer de colo de útero. Especialistas ouvidos pelo JT atribuem o panorama da capital para a doença ao estilo de vida da paulistana. Isso porque o tumor de mama, diferentemente do que ocorre com outros tipos de câncer, tem relação direta com o estilo de vida urbano. Os fatores externos são, portanto, determinantes para essa neoplasia: apenas 10% delas têm origem genética.

 

"Vários estudos comprovam que, quanto maior o nível socioeconômico de uma população, mais altos são os índices de câncer de mama", diz José Roberto Filassi, mastologista do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo. Nas capitais, ressalta, os hábitos diários costumam ser menos saudáveis. "Mulheres desses locais são mais sedentárias, ingerem mais álcool, fumam, têm filhos mais tarde e amamentam menos", enumera, listando alguns dos fatores de risco da doença. Soma-se a isso a maior exposição à poluição e ao estresse.

 

A gerente de eventos Rosemary Amaral, de 45 anos, encaixa-se no perfil urbano. Nunca foi casada, não teve filhos. E conta que só deixou o sedentarismo em 2009, quando descobriu a doença. "Estava muito estressada com o meu trabalho, cuidava muito das pessoas e esquecia de cuidar de mim", lembra (conheça a história dela ao lado). A falta de exercícios físicos também era uma realidade na vida da cabeleireira Maria Aparecida Araújo, de 41 anos, que teve de mudar de hábitos após enfrentar o câncer. "Fiz um autoexame e detectei um carocinho do tamanho de uma bolinha de gude. Pouco tempo depois estava do tamanho de uma laranja. Mas procurei ajuda rápido", lembra. O diagnóstico veio três meses após Maria perder o pai e a mãe, no mesmo dia - ele, vítima de um câncer de boca; ela, afetada por um acidente vascular cerebral.

 

A boa notícia é que o câncer de mama, se detectado no início, é curável na maioria dos casos. No Brasil, contudo, o diagnóstico tardio eleva as taxas de mortalidade. A Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama (Femama) calcula que 30 mulheres morram por dia no País por causa da neoplasia. E quase metade (45,3%) é diagnosticada em estágio avançado.

 

A dona de casa Gisele Cifarelli, de 40 anos, sabe o quanto a rapidez é essencial contra o tumor. Passaram-se só três meses entre o autoexame que lhe indiciou um caroço no seio e a retirada da mama, em 2009. Ela teve o apoio da filha, de 8 anos, e de uma sobrinha que se mudou para sua casa apenas para auxiliá-la. "Encarei o problema, acreditei no tratamento. Hoje, estou livre da doença", diz. Em julho, Gisele fez a cirurgia de reconstrução da mama e, além de recuperar a saúde, resgatou também sua autoestima.

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DEPOIMENTO - "Essa experiência toda  me ensinou a priorizar o que é importante de verdade"

 

O olhar do médico ficou triste, mas ele foi cuidadoso ao dar a notícia: eu tinha um câncer de mama. Meus sentimentos se misturaram. Tristeza, medo, desorientação... Por um momento achei que eu não estava vivendo aquilo. Abracei minha mãe e choramos juntas. Então, o doutor me disse: "Não pergunte o porquê disso, a pergunta é ‘para quê?’"

 

Respirei fundo. Naquele momento ‘escolhi’ que venceria aquele câncer. Eu sabia que poderia contar comigo. Meu corpo estava doente, mas meu espírito, não. Manter a autoestima é imprescindível, nunca deixei de me maquiar e de usar os sapatos de salto que adoro.

 

Um dia meu irmão acariciou meu rosto e disse que me amava, foi a primeira vez que ouvi isso dele. Então, só por isso, já valeu. Lembrei de novo da pergunta: ‘Para quê?’ É para a gente entender que o melhor da vida é amar e ser amado. Essa experiência me ensinou a priorizar o que é importante de verdade.

 

Hoje, procuro não me estressar nem me entristecer com coisas que não importam. Aprendi a não trocar mais o trabalho, mesmo amando o que faço, por alguns momentos com a família, com os amigos. Olho para o meu corpo e não reclamo mais de uma celulite ou uma gordurinha extra... Isso não é nada!

 

Quero ser menos crítica comigo e com os outros, quero adotar uma criança. E comemorar os próximos aniversários com as pessoas que me ajudaram a superar essa etapa.

 

Chance de cura pode passar de 90%

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Se diagnosticado precocemente, o câncer de mama é curável em mais de 90% dos casos. Para isso é preciso caprichar no autoexame, que deve ser feito mensalmente, a partir dos 20 anos, e principalmente na realização da mamografia.

 

Para as mulheres de grupos populacionais com risco elevado para a doença, é indicado que o procedimento seja feito a partir dos 35 anos, anualmente. Estão nessa categoria pessoas com história familiar da doença em parentes de primeiro grau (mãe ou irmã), por exemplo. Para as demais, os ginecologistas costumam indicar o exame a partir dos 40 anos, com ênfase a partir dos 50, já que o avanço da idade aumenta o risco para a doença.

 

Apesar do peso da genética, o estilo de vida interfere muito no tumor. Segundo a mastologista Maria do Socorro Maciel, diretora do Núcleo de Mastologia do Hospital A. C. Camargo, ter uma rotina saudável, mantendo o peso adequado por meio de uma dieta nutritiva e da prática de exercícios físicos, faz parte da prevenção primária.

 

Alguns estudos associam a exposição à radiação ionizante, sobretudo na puberdade, mesmo em baixas doses, ao risco aumentado para o tumor.

 

De acordo com o Inca, "ainda é controvertida a associação entre o uso de contraceptivos orais e o aumento do risco para o câncer de mama, apontando para certos subgrupos de mulheres: as que usaram contraceptivos orais de dosagens elevadas de estrogênio, as que fizeram uso da medicação por longo período e as que usaram anticoncepcional em idade precoce". Isso porque a doença tem ligação com alterações hormonais, sobretudo no estrogênio.

 

O neoplasia se manifesta, muitas vezes, por meio de um nódulo no seio, acompanhado ou não de dor mamária. Podem surgir alterações na pele que recobre a mama, como retrações, e também nódulos palpáveis nas axilas.

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