Cientistas anunciam infecção pelo mayaro, mas não há registro de transmissão pelo 'Aedes'

Caso foi registrado no Haiti e cientistas especulam que vírus pode estar se espalhando por meio do mosquito; para especialista, não há motivo para alarme

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Por Fabio de Castro e Ligia Formenti
Atualização:
Não há registro de transmissão do vírus mayaro pelo 'Aedes' Foto: REUTERS

Cientistas americanos anunciaram ter encontrado, no Haiti, um caso inédito de infecção pelo mayaro - um vírus típico da Amazônia, que causa uma febre semelhante à chikungunya. De acordo com eles, o caso pode ser um indício de que o vírus está se espalhando pelas Américas. 

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Um especialista em virologia consultado pelo Estado, no entanto, afirma que não há motivos para alarme, já que o vírus, conhecido há mais de 60 anos, por enquanto só é transmitido por mosquitos silvestres - e não pelo Aedes aegypti, que poderia espalhá-lo em áreas urbanas. O Ministério da Saúde informou que não há registros de transmissão da febre mayaro por meio do Aedes aegypti. 

O caso registrado no Caribe pela equipe liderada por John Lednicky, da Universidade da Flórida (Estados Unidos) foi identificado a partir de amostras de sangue de um menino de 8 anos, morador de uma zona rural do Haiti. 

Até hoje, o mayaro só havia causados surtos isolados na região amazônica, em países como Brasil, Colômbia e Venezuela. Em 2015, um surto de febre mayaro foi registrado em Goiás, atingindo cerca de 40 pessoas. 

O registro de um caso no Haiti, no entanto, não significa necessariamente que o vírus esteja avançando pelo mundo, de acordo com o virologista brasileiro Mauricio Lacerda Nogueira, do Laboratório de Pesquisas em Virologia da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto.

"O vírus não provocou nenhuma epidemia mundial nas últimas décadas e nada indica que isso irá ocorrer da noite para o dia apenas porque tivemos um caso no Haiti. Precisamos ficar em alerta, mas não podemos ceder ao alarmismo", disse Lacerda ao Estado.

O Brasil é o país com o maior número de casos de mayaro no mundo, de acordo com Lacerda. Mas ele só se tornaria um problema epidemiológico grave - como a dengue, por exemplo - caso se adaptasse para utilizar o Aedes aegypti como vetor. Mas essa possibilidade, por enquanto, não passa de uma especulação.

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"O mayaro pode se tornar um problema se começar a ser transmitido pelo Aedes aegypti. Sabemos que em laboratório o Aedes é capaz de transmiti-lo, mas até onde sabemos, nunca houve uma epidemia de mayaro que possa ser atribuída a esse mosquito, nem no Brasil, nem nas Américas" disse Lacerda.

Vacina pronta. Diversos grupos de pesquisa no Brasil têm feito estudos sobre o mayaro - incluindo a equipe liderada por Lacerda - e até mesmo uma candidata a vacina já foi desenvolvida em laboratório. 

"A vacina está praticamente pronta, mas os testes clínicos não avançaram ainda por falta de interesse da indústria farmacêutica. Há poucos casos e, portanto, pouca procura. Não sabemos qual é o impacto socioeconômico da doença", disse.

Apesar dos vários estudos, segundo Lacerda o mayaro ainda é de maneira geral muito pouco estudado e pouquíssimo conhecido pela comunidade científica e médica. "Isso é o mais preocupante em relação a esse vírus. Ao contrário da chikungunya, que tem sintomas muito parecidos, o mayaro é completamente desconhecido por 95% da comunidade médica", afirmou.

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Segundo ele, o fato da maior parte dos médicos nunca terem ouvido falar do vírus é problemático porque é possível que muitos casos atribuídos à chikungunya sejam na realidade casos de mayaro. Atualmente, o diagnóstico de mayaro só é feito por meio de teste molecular. 

"Além disso, se o vírus não é reconhecido, isso significa que se ocorrer uma grande epidemia vamos demorar para detectá-la, como ocorreu com a zika, cujo alastramento só foi percebido quando já tínhamos dezenas de milhares de casos", disse Lacerda.

Alerta para cientistas. Lacerda afirma que o lado positivo da preocupação dos cientistas americanos com o caso de mayaro registrado no Haiti é chamar a atenção da comunidade científica e médica para a existência do vírus - o que provavelmente resultará em mais estudos sobre o vírus.

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"O mayaro pode ser visto como uma chikungunya brasileira, mas é bastante negligenciado. O vírus é amplamente distribuído na Amazônia e no Cerrado e, caso um dia seja transmitido pelo Aedes aegypti, realmente teremos um problema. Por isso é preciso avaliar a epidemia que tivemos em Goiás, para confirmar se realmente ela foi produzida por mosquitos da fauna silvestre, ou se há alguma possibilidade de envolvimento do Aedes", declarou o cientista.

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Até agora, porém, de acordo com o Ministério da Saúde, não há registros no Brasil de transmissão da mayaro por meio do Aedes aegypti. Segundo a pasta, o vírus é considerado endêmico na região Amazônica e o Brasil registrou entre dezembro de 2014 e janeiro deste ano 70 casos confirmados da doença cujos sintomas são semelhantes ao de dengue e chikiungunya. 

Ainda de acordo com o ministério, não há mortes confirmadas pela doença no País e os casos confirmados são esporádicos e ocorrem em áreas rurais. Não há casos de transmissão urbana. Não há terapia específica ou vacina. Os primeiros sinais da infecção são febre, cansaço e que podem ser seguidos por manchas vermelhas, dor de cabeça e nas articulações.