Com UTIs covid menos cheias, Estados retomam cirurgias com mutirões e pagamento extra

Bahia estima pelo menos 50 mil procedimentos represados; Minas prevê acelerar filas pagando o dobro do valor de remuneração a hospitais por alguns procedimentos

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Por José Maria Tomazela, Aline Reskalla e Tailane Muniz
4 min de leitura

SOROCABA, BELO HORIZONTE E SALVADOR - Com o avanço da vacinação e redução de ocupação das UTIs covid, governos estaduais e prefeituras têm se mobilizado para retomar as cirurgias eletivas (não urgentes). Com a necessidade de abrir espaço nas unidades de saúde e reduzir o risco de contágio, pacientes ficaram na fila de espera por esses procedimentos e, agora, a demanda represada pressiona os sistemas de saúde. 

Hoje com ocupação de UTIs no patamar de 60%, o governo de Minas prevê acelerar as cirurgias pagando o dobro do valor de remuneração a hospitais por alguns procedimentos. Pela tabela do SUS, um hospital recebe R$ 376,95 por uma cirurgia de hérnia, por exemplo. “Poderemos até dobrar esse valor, ainda estamos estudando o critério e preparando uma resolução sobre o assunto”, disse o secretário estadual da Saúde, Fábio Bacheretti. 

Ele disse que, neste momento, retomar as cirurgias eletivas também esbarra na carência de kits intubação. Por esse motivo, a secretaria estabeleceu o seguinte critério: municípios que declararem ter estoque do kit para 30 dias podem retomar as cirurgias eletivas pelo SUS. Na rede privada, como hospitais têm mais facilidade de adquirir insumos, muitos já estão realizando.

O Estado quer chegar, ao fim de 2022, com menos fila de cirurgias do que tinha antes da pandemia. Segundo o governo estadual, em 2019, foram feitas 185 mil operações. Já em 2020, com restrições impostas, foram realizadas 97 mil. Em 2021, foram 26.935 até maio.

Em alguns casos, o adiamento das cirurgias eletivas trouxe sequelas graves ao paciente. Há quatro meses, o comerciante mineiro Pedro Mordente Júnior começou a perder o movimento dos braços. Depois, das pernas. Por três vezes entre março e maio, os médicos chegaram a marcar a cirurgia na coluna, mas, sempre na véspera, o procedimento era cancelado.

Não havia leitos de UTI. Todos estavam ocupados com pacientes graves da covid. As dores iam aumentando e o desespero também. "Cheguei a cair várias vezes", conta ele. Há 40 dias, e seis meses após o diagnóstico de calcificação na coluna, ele conseguiu ser operado via plano de saúde. Como o quadro foi se agravando, a cirurgia foi complicada. Começou a ser feita pelo pescoço, não deu certo, foi interrompida e retomada dias depois. E ele não foi para a terapia intensiva, como seria recomendado. O comerciante ainda não voltou a andar. 

Governo de Minas quer chegar a 2022 com fila de cirurgias menor do que no início da pandemia; no 1º semestre deste ano, sistema hospitalar da capital mineira passou por falta de vagas na UTI Foto: AP Photo/Eraldo Peres

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Bahia quer controlar situação até o fim do ano

A Bahia também prevê retomar cirurgias eletivas nas próximas semanas. O secretário da Saúde, Fábio Vilas-Boas disse ao Estadão que a fila de espera é de 50 mil – o total pode chegar a 70 mil se contar casos de maior complexidade. A previsão é de que a situação seja controlada até o fim do ano e são previstos pequenos mutirões.

A decisão foi tomada após a ocupação cair para 59% nas UTIs – a menor desde março. Segundo o secretário, as unidades devem manter o uso racional de medicamentos, como sedativos, diante da escassez no mercado. As cirurgias eletivas, a exemplo da retirada de hérnias e vesículas, não são consideradas de emergência. Segundo Vilas-Boas, o risco de morte pela espera não é alto. “O que acontece, na maioria das vezes, é o incômodo causado por dores. Tem casos onde a pessoa precisa passar, por exemplo, por uma transfusão”, diz.  

Referência em processos cirúrgicos eletivos, o Hospital Geral Roberto Santos (HGRS), em Salvador, fez ano passado 8.902 cirurgias, mesmo com a pandemia. Segundo a pasta da Saúde, isso colaborou para a redução de 83% da fila de espera, à época. Há dois meses, o HGRS chegou a abrir 100 leitos de enfermaria para atender pacientes não infectados pelo coronavírus, a fim de desafogar as unidades direcionadas à covid-19. Foi no HGRS que a dona de casa Isadora Rodrigues, de 55 anos, iniciou o tratamento para retirada de pedra nos rins. O procedimento estava marcado para setembro, mas ainda hoje não tem previsão. “Fiz uma série de exames, mas talvez tenha de refazer pelo tempo que passou. Vou pagar consultas particulares para agilizar o processo. A gente entende que a pandemia acabou tirando tudo do eixo, mas sinto muita dor, além do medo que tenho de agravar”, diz Isadora.

Paraná autorizou operações não urgentes esta semana

Desde a última segunda-feira, 12, hospitais públicos e privados do Paraná estão autorizados a retomar procedimentos cirúrgicos eletivos, quando isso não trouxer prejuízo ao atendimento de pacientes com covid-19. Conforme o secretário da Saúde, Beto Preto, a liberação foi possível diante da menor ocupação dos leitos covid. “Temos observado redução na taxa de transmissão do coronavírus, graças à vacinação e, com isso, liberamos os procedimentos eletivos para aqueles hospitais que possuem condições de realizar esse serviço sem prejudicar os demais atendimentos”, disse. A decisão foi acertada com as federações dos hospitais e santas casas. “A suspensão dos procedimentos foi necessária para direcionar os medicamentos de intubação e leitos de UTI para atendimento à covid. Agora podemos retomar o atendimento para diminuir a fila de pacientes eletivos”, disse o presidente da Federação das Santas Casas e Hospitais Beneficentes do Paraná, Flaviano Feu Ventorim. Ele recomendou que os hospitais mantenham o equilíbrio entre urgências e emergências e os casos não urgentes. “Com a flexibilização, o número de acidentes aumentou e, nos fins de semana, temos muitos pacientes com traumas, que acabam internados e mantêm os leitos ocupados durante a semana”, disse.

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