Coronavac: veto da Anvisa à vacina em adolescentes e crianças era esperado, dizem especialistas

Médicos reforçam que a solicitação de mais dados é um procedimento natural do órgão técnico; órgão regulador rejeitou aval de uso do imunizante em menores de 18 anos

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Por Ítalo Lo Re
Atualização:

A decisão da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) de não autorizar a aplicação da vacina contra a covid-19 Coronavac em crianças e adolescentes de 3 a 17 anos não foi vista com surpresa por especialistas em saúde. Eles reforçam que a solicitação de mais dados é procedimento natural do órgão técnico e apontam a não realização de um estudo de fase 3 — que testa a segurança e a eficácia do produto em um número maior de voluntários — como um fator decisivo para o veto. Fabricante do único imunizante aprovado pela Anvisa para vacinação de adolescentes no Brasil, a Pfizer apresentou um estudo de fase 3 à agência reguladora.

O médico sanitarista Gonzalo Vecina acredita que a Anvisa "operou corretamente mais uma vez" ao não autorizar a Coronavac em crianças e adolescentes. "O estudo realizado pela Sinovac foi um estudo de fase 1 e 2 com pouco mais de 580 crianças. Suficiente para o primeiro passo da análise e para dizer que a vacina é segura e eficaz e pode passar para a fase 3 com um número amostral maior", explica o ex-presidente da Anvisa, reforçando que os estudos de fase 3 seriam importantes para a aprovação pela Anvisa.

Funcionário do Instituto Butantan fecha uma caixa com doses da Coronavac Foto: Amanda Perobelli/ Reuters

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Segundo Vecina, o problema maior da aprovação para uso de vacinas em crianças é que elas se tratam de organismos imaturos, em que a questão da segurança é crítica. "Por isso que os estudos são mais importantes ainda. Ainda mais que a doença é menos frequente e grave em crianças. A segurança tem de ser garantida", acrescenta. "A empresa (Sinovac, responsável pela produção da Coronavac) deve oferecer mais dados para (a vacina) poder ser aprovada. Continuamos somente com a Pfizer para jovens de 12 a 17 anos, que fez um bom estudo de fase 3."

Diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), Renato Kfouri acredita que a decisão tomada pela Anvisa era esperada. "Nenhuma surpresa, os dados são muito frágeis no sentido do número de crianças estudadas", aponta. "Certamente, é um número muito pequeno em uma faixa etária muito larga, de 3 a 17 anos, e acho que nem o próprio Butantan imaginava que a liberação viria."

Por outro lado, Kfouri destaca que a decisão tomada pela Anvisa não que dizer que a vacina não funciona em crianças e adolescentes. "Os dados são ainda insuficientes. Precisa deixar isso claro", destaca o diretor de SBIm. "Não é uma questão de reprovação, (de julgar que) a vacina não serve para crianças. Ainda não se conseguiu demonstrar com segurança sua eficácia para utilização nessa faixa etária."

Por mais que acredite que a Anvisa tenha cumprido seu papel técnico na decisão, a infectologista da Unicamp Raquel Stucchi conta que acreditava que a tecnologia utilizada no desenvolvimento da Coronovac poderia ter contribuído para uma decisão favorável da agência. "Vários de nós tínhamos uma esperança muito grande de que a Coronovac fosse, sim, aprovada pela Anvisa para uso em crianças e adolescentes por ser uma vacina que utiliza uma plataforma, uma receita que já é muito conhecida, a de vírus inativado", diz.

A infectologista explica que as vacinas desenvolvidas com essa tecnologia são normalmente seguras e a Coronovac tem se mostrado com um "perfil de segurança muito bom em todas as idades" que está sendo administrada. "Termos a Coronavac para essa faixa etária seria muito importante, porque ela precisa ser vacinada e pela idade deve responder muito bem à vacina. Teríamos uma maior quantidade de vacinas para completar a imunização da nossa população”, destaca. "Mas a Anvisa é técnica, preza pela segurança máxima dentro do que é possível para a população que será vacinada e, nesse sentido, foi rigorosa", reconhece Stucchi.

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Em evento na manhã desta quinta-feira, 19, o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), respondeu uma pergunta sobre o assunto. Segundo ele, "é perfeitamente natural" que a Anvisa solicite mais informações e a complementação dos dados que foram providas pelo Instituto Butantan a partir dos estudos realizados na China.

"O Instituto Butantan já emitiu inclusive um comunicado oficial de que vai atender (as solicitações). E encaminhará as informações complementares para a submissão da vacina, a Coronavac, para que ela possa ser avaliada como mais uma vacina para o atendimento a crianças de 3 a 11 anos e de jovens de 12 a 17 anos", acrescentou o governador.

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