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Criação de fármacos para Doença de Chagas é impulsionada por pesquisa

Instituto de São Carlos constata que, na presença de moléculas, atividade enzimática diminui

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Por Redação
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SÃO PAULO - A descoberta de moléculas importantes para uma enzima do parasita Trypanosoma cruzi, causador da Doença de Chagas, pode abrir novos caminhos no desenvolvimento de fármacos para o tratamento. A pesquisa, do Instituto de Química de São Carlos (IQSC), constatou que, na presença de certas moléculas, a atividade enzimática diminuiu, o que interfere no ciclo de vida do parasita. O estudo foi constituído, basicamente, por duas fases. Na primeira, buscou-se no computador, por meio de um software específico, substâncias de interesse. Depois, com elas já selecionadas, teve início a segunda fase, na qual foram realizados ensaios em laboratório para verificar se as substâncias eram, de fato, importantes para a doença em análise. “Fiz ensaios in vitro, nos quais isolei a enzima em solução, e percebi que a atividade enzimática foi diminuindo na presença das moléculas”, explica Juliana Cheleski, autora da pesquisa financiada por bolsa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). A enzima diidroorotato desidrogenase (DHODH) é fundamental para o T. cruzi. Assim, encontrar uma molécula que se “encaixe” a ela e interrompa sua atividade é importante no desenvolvimento de fármacos, na medida em que pode parar o ciclo de vida do parasita. Além disso, segundo o professor Carlos Alberto Montanari, orientador da pesquisa e coordenador do Grupo de Química Medicinal do IQSC, não existe, atualmente, um medicamento seguro para tratar os pacientes, o que torna ainda mais importante a descoberta de moléculas com potencial para se tornar fármacos e, posteriormente, medicamentos. Recursos tecnológicos Para que um novo fármaco seja descoberto, são necessárias três fases. Primeiro, é feita a seleção de moléculas candidatas a fármaco. Depois, há uma etapa pré-clínica, na qual são realizados ensaios, inclusive em animais, para avaliar os resultados. Por fim, a fase em que as substâncias bioativas - que têm efeito químico farmacológico em organismos vivos - são testadas em seres humanos. A pesquisa do IQSC inovou ao estudar métodos computacionais para qualificar e selecionar moléculas com potencial para se tornar substâncias químicas bioativas. Virtualmente, a primeira etapa tornou-se mais rápida, o que economizou tempo e também custos. “O computador fez um trabalho imenso, como achar uma agulha em um palheiro, já que buscou entre milhões de moléculas as que interessavam ao trabalho”, afirma Montanari. A utilização de técnicas de ensaio com aparelhos modernos, como o método biocalorimétrico, que detecta calor para avaliar o padrão das reações, também esteve presente no estudo de Juliana. Por agregar o uso de recursos tecnológicos à descoberta científica, a pesquisa ganhou o prêmio “Sunset Molecular” no 18º European Symposium on Quantitative Structure-Activity Relationships, congresso internacional promovido na Grécia, em setembro. Doença negligenciada A Doença de Chagas pertence à categoria das chamadas doenças negligenciadas, aquelas que, em geral, estão presentes em países pobres e não geram retorno financeiro à indústria farmacêutica, já que a população de baixa renda não tem dinheiro para comprar remédio, e os custos para sua produção são altos. “Moléculas candidatas a fármaco de doenças negligenciadas não geram interesse, pois os medicamentos não podem ser caros. O governo tem de subsidiá-los, como faz no caso dos pacientes com aids, e distribuí-los para a população”, observa Juliana. O prêmio do artigo, intitulado “Calorimetria, ensaio virtual e elucidação da estrutura cristalográfica de novos inibidores da enzima DHODH de Trypanosoma cruzi“, também é justificado pela doença estudada. “A Doença de Chagas persiste ainda hoje. Além disso, ela tem sido levada para fora dos países pobres, alcançando os ricos”, afirma Montanari. “O prêmio é importante não apenas pelo reconhecimento, mas por mostrar que a universidade retribui o investimento feito pela sociedade. Às vezes, transmitimos a ideia de que estamos encastelados, mas não é verdade. Devolvemos à sociedade com nossas pesquisas”, completa o orientador.

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