Decisão da África do Sul de suspender vacina de Oxford lança alerta para risco de variante no Brasil

Medida foi adotada após estudo mostrar baixa eficácia de imunizante contra cepa local do Sars-CoV-2; OMS diz que pesquisa tem número limitado de participantes

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Por Giovana Girardi
Atualização:

A decisão da África do Sul de suspender temporariamente a vacinação contra covid-19 com o imunizante da Oxford/Astrazeneca por ele apresentar uma eficácia baixa contra a nova variante do vírus encontrada no país fez a Organização Mundial da Saúde (OMS) reavaliar sua produção pelo consórcio Covax. A situação também lança um alerta para o Brasil sobre o risco da rápida disseminação das novas variantes do coronavírus Sars-CoV-2.

Voluntário recebe vacina de covid-19 da AstraZeneca na África do Sul. Foto: Siphiwe Sibeko/AP

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Em coletiva à imprensa, o diretor geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, disse nesta segunda-feira, 8, que a suspensão temporária do uso da vacina pelos sul-africanos é preocupante, mas fez ressalvas. A primeira é que a decisão foi tomada em cima de um estudo pequeno, que mostrou uma eficácia mínima, de apenas 22%, do imunizante em prevenir doenças leves a moderadas causadas pela nova variante. “Considerando o tamanho limitado da amostra e o perfil jovem e saudável dos participantes, é importante determinar se a vacina se mantém efetiva (como já é hoje) em prevenir casos mais severos”, destacou.

Nesta segunda, o Grupo Consultivo Estratégico de Especialistas em Imunização da ONU (Sage) se reuniu para revisar as evidências sobre a vacina de Oxford – incluindo seu desempenho contra as variantes virais – e para considerar o impacto do produto e avaliar a relação risco/benefício de uso em casos com dados limitados. As recomendações serão apresentadas para Ghebreyesus nesta terça e devem também ter impacto sobre a produção das vacinas que está sendo feita pelo consórcio.

Países no início da campanha de vacinação precisam ficar mais atentos

A capacidade da variante sul-africana de driblar a vacina de Oxford traz uma preocupação extra para países que ainda estão muito no início do seu processo de imunização, como é o caso do Brasil. “Esses resultados (da África do Sul) são uma lembrança de que nós precisamos fazer tudo o que pudermos para reduzir a circulação do vírus com medidas de saúde pública comprovadas”, alertou Ghebreyesus.

O surgimento de mutações é algo esperado pela própria natureza dos vírus, mas tende a acontecer mais quanto maior é sua circulação. É justamente quando o vírus se replica que as mutações podem ocorrer. Por isso, tanto a OMS quanto pesquisadores e médicos têm insistido que a melhor forma de garantir que a vacina nos proteja é protegendo a própria vacina ao evitar que as novas variantes surjam.

“Todos temos um papel em proteger as vacinas. Toda vez que você decide ficar em casa, evitar multidões, usar máscara ou lavar as mãos, você está negando ao vírus a oportunidade de se espalhar, de mudar de maneiras que poderiam deixar as vacinas menos efetivas”, disse o diretor da OMS.

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Instituto Serum, onde está sendo produzida avacina contra o novo coronavírus da AstraZeneca e Oxford, em Pune, na Índia. Foto: Sam PANTHAKY / AFP

A epidemiologista brasileira Denise Garrett, vice-presidente do Instituto Sabin Vaccine, lembra que a África do Sul pôde tomar a decisão de suspender temporariamente a vacina de Oxford não por achar que ficar sem nada era melhor do que usá-la, mas porque o país tinha à disposição outros imunizantes que se mostraram menos impactados pela mutação. A ideia é definir uma estratégia de uso das diversas vacinas. Assim, a de Oxford pode vir a ser usada, por exemplo, em áreas em que é menor a circulação da nova variante do vírus.

Nesta segunda, a Pfizer divulgou que sua vacina com a BioNTech foi capaz de neutralizar a cepa da África do Sul. A vacina da Novavax também demonstrou ser eficaz. Já a Coronavac, do Instituto Butantan e do laboratório chinês Sinovac, ainda não foi avaliada diante das novas cepas, assim como nenhuma vacina ainda foi testada ante à variante que surgiu em Manaus e que é mais próxima da mutação da África do Sul.

“Isso tem de servir para nos despertar a consciência do que é preciso nessa fase da pandemia: vacinar o mais rápido possível o maior número de pessoas, principalmente porque no Brasil ainda se acredita que a nova variante pode não estar tão disseminada, apesar de estarmos voando praticamente às cegas, com pouca vigilância”, alerta a pesquisadora. “Somente diminuindo a transmissão viral vamos conseguir evitar mutações e mais variantes futuras. Quanto mais for transmitido, mais surpresas poderemos ter.”

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