Depois do piercing, a mesa de operação

Uso do acessório em qualquer parte do corpo pode causar infecções

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Por Fernanda Aranda e do Jornal da Tarde
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Quando Ariana Batista de Oliveira, hoje com 22 anos, decidiu colocar um piercing na parte superior da orelha, queria deixar sua marca registrada. Só não contava que a marca seria para a vida inteira: uma cicatriz enorme, complicações de saúde e até a necessidade de uma cirurgia para tratar a infecção. E ela não é a única que carrega esses "efeitos colaterais" do acessório. Só no Hospital das Clínicas, 80% dos pacientes que chegam à unidade por problemas na colocação da jóia, precisam recorrer à mesa de operação. "Eu sofri demais. Minha orelha dobrou de tamanho, sentia muita dor e vergonha. Até perdi oportunidades de emprego. O piercing parecia tão inofensivo, mas resultou em um quelóide (cicatriz muito saliente e avermelhada)", conta a jovem que, dois anos depois do ocorrido, ainda precisa fazer tratamento. Segundo o diretor da Clínica de Otorrinolaringologia do HC, Perboyre Sampaio, não há nada de inofensivo em um piercing e as chances de complicações são muitas. "Recebemos, em média, 20 pacientes por ano que ficam muito machucados. Nos casos mais graves, perdem a orelha, o nariz fica necrosado e as marcas são eternas. Nem sempre dá para corrigir." O alarde não vem só desse especialista. Na realidade, é difícil encontrar algum profissional da área médica que defenda a colocação do piercing, em qualquer parte do corpo. "Não há uma região isenta de riscos de infecção. O organismo reage severamente ao metal e não há como prever quem pode apresentar essas reações", alerta o diretor da Sociedade Paulista de Estomatologia e Câncer Bucal, Carlos Eduardo Ribeiro da Silva. Mas em alguns locais do corpo, o perigo é ainda mais iminente. Silva cita que na língua, por exemplo, o piercing atua como um canal direto entre as bactérias e a boca, o que facilita o contágio de doenças, como hepatite e HPV. Os problemas não param por aí. Uma pesquisa ainda inédita da Universidade de Santo Amaro (Unisa), realizada com 100 pessoas de São Paulo com piercing na língua, mostrou que em 100% dos casos foi encontrado alguma alteração, desde inflamações rotineiras a processos crônicos. Nas análises por biópsia, foi comprovado que em dois casos havia lesões cancerígenas. "Sem contar que, como a língua pode ficar muito inchada, dificulta a respiração, já houve registros no Brasil de pessoas que morreram sufocadas por causa disso", conta o dentista Artur Cerri, professor da Unisa e coordenador da pesquisa. Os especialistas explicam ainda que colocar o acessório em lugares renomados e higiênicos não é garantia de evitar totalmente as complicações. "Por mais experiência que o colocador tenha, existem algumas características do corpo que precisam de conhecimento de saúde. Eu sou contrário e não recomendo a prática", fala Carlos Eduardo. Todos concordam sobre as chances reais de problemas e também que é muito difícil convencer os jovens e deixarem de lado essa "febre". Um exemplo é o próprio estudo da Unisa. Mesmo depois que os participantes souberam dos riscos, apenas 25% deixaram de usar piercing na língua. Quem se esforça para convencer a galera é Ariana que, de adepta ao uso, tornou-se a maior representante da turma dos contrários. "Dá para mostrar a vaidade de muitos outros jeitos. Pintando o cabelo, fazendo chapinha, usando roupas legais. O risco do piercing não vale à pena", define. Pequenos e perigosos  A pele em cima da orelha é muito parecida com a do nariz, dois locais muito procurados para piercing. Os médicos dizem que as cartilagens nessas regiões não são adaptados para a perfuração, como é o caso do lóbulo da orelha. Isso pode provocar infecção aguda, deformações, quelóides e reações perigosas Involuntariamente, a língua se mexe 1.300 vezes por dia e a maioria dos movimentos ocorre à noite. O trauma com o piercing provoca lesões que podem até evoluir para câncer, dependendo do tempo de exposição. Sem contar que há quem coloque o brinco entre os dentes, o que pode quebrá-los As regiões do umbigo e da sobrancelha são praticamente iguais. Os especialistas dizem que são as partes mais seguras para a colocação da jóia. Alertam, porém, que não estão isentas de riscos de infecção, já que a reação não é previsível e cada organismo se manifesta de um jeito diferente.

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