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Dexametasona reduz tempo de entubação em doentes graves com covid, mostra estudo brasileiro

Pesquisa realizada por principais hospitais privados do País reafirma benefício do corticoide no tratamento de pacientes com quadros críticos da doença; para quadros leves ou moderados, remédio pode piorar quadro

Foto do author Fabiana Cambricoli
Por Fabiana Cambricoli
Atualização:

Um estudo brasileiro coordenado pelos principais hospitais privados do País mostra que o corticoide dexametasona foi capaz de reduzir o tempo de entubação em pacientes com quadros graves de covid, o que diminui o risco de complicações associadas à ventilação mecânica, como infecções e lesões causadas pelo tubo, e pode acelerar a recuperação do paciente.

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O dexametasona é um anti-inflamatório antigo e de baixo custo, usado desde a década de 60 principalmente no tratamento de doenças inflamatórias e respiratórias, como artrite reumatoide e asma. O estudo avaliou o número de dias, dentro de um período de seguimento de quatro semanas, que os pacientes ficaram livres do uso de respiradores. No grupo que tomou a dexametasona, foram 6,6 dias. No grupo controle, que recebeu somente o cuidado padrão para a doença, foram 4 dias. 

A pesquisa foi publicada nesta quarta-feira, 2, no renomado periódico científico Journal of the American Medical Association (Jama) junto a outros três estudos internacionais que também avaliaram o desempenho de corticoides contra a covid. A conclusão é de que essa classe de medicamentos reduz a mortalidade por covid.

Participaram do ensaio clínico 299 pacientes de 40 hospitais públicos e privados do País, sob a coordenação de oito instituições: Hospitais Sírio-Libanês, Albert Einstein, HCor, Moinhos de Vento, Oswaldo Cruz e Beneficência Portuguesa de São Paulo, além do Brazilian Clinical Research Institute (BCRI) e Rede Brasileira de Pesquisa em Terapia Intensiva (BRICNet).

Paciente internado no Hospital Albert Einstein, em São Paulo Foto: Foto: NILTON FUKUDA/ESTADÃO

Elas fazem parte da aliança Coalizão Covid-19 Brasil, responsável pela realização de nove estudos clínicos de possíveis tratamentos para a doença. Essa é a segunda pesquisa do grupo que tem seus resultados divulgados. A primeira, apresentada em julho, mostrou que a hidroxicloroquina, associada ou não ao antibiótico azitromicina, não tem eficácia no tratamento de pacientes internados com quadros leves e moderados de covid-19.

Os participantes foram divididos, de forma randomizada (por sorteio), em dois grupos: um deles, com 151 pacientes, foi tratada com dexametasona intravenosa por dez dias, e o outro, com 148 doentes, recebeu o suporte padrão. Para ser incluído no estudo o paciente tinha que estar entubado e com baixa oxigenação sanguínea.

De acordo com os pesquisadores, o estudo brasileiro não foi desenhado para medir o impacto na queda de mortalidade pois precisaria de uma amostra maior de pacientes e levaria mais tempo para ser concluído. Eles ressaltam, no entanto, que, além do resultado de redução no tempo de entubação, outros resultados confirmam o benefício da medicação no tratamento.

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“Os outros resultados do estudo, mesmo não tendo diferença estatisticamente significativa, apontam para o benefício do corticoide. Os números de mortes e disfunção orgânica foram menores no grupo que tomou a medicação”, explica Luciano Cesar Pontes Azevedo, superintendente de ensino no Hospital Sírio-Libanês, integrante do comitê-executivo da Coalizão Covid-19 Brasil e um dos autores do estudo.

A pesquisa apontou ainda, de acordo com os cientistas, que o tratamento é seguro nos casos avaliados. “Uma das nossas preocupações era verificar efeitos colaterais que já conhecemos desse medicamento, como quadros infecciosos e aumento do nível de glicose no sangue. Vimos que o uso do dexametasona não veio acompanhado de maior frequência desses eventos”, explica o cardiologista Renato Lopes, pesquisador e professor da Unifesp e da Duke University (EUA), diretor da Brazilian Clinical Research Institute (BCRI) e também integrante do comitê-executivo da Coalizão Covid-19 Brasil.

Os pesquisadores alertam que o benefício e a segurança da dexametasona são válidos para pacientes graves com covid, que precisam de suporte respiratório. Para quadros leves ou iniciais, o medicamento não tem benefício comprovado e pode até piorar a condição. “O corticoide não vai curar a doença ou combater o vírus, ele vai modular a resposta inflamatória do organismo para combater uma reação exagerada. Só que essa resposta, no início da infecção, é o que combate o vírus. Ela só se torna prejudicial se fica desenfreada. Se você a bloqueia logo no início, pode aumentar o tempo dos sintomas”, explica Azevedo.

As novas evidências reafirmam os achados de um estudo da Universidade de Oxford (Reino Unido) divulgado em junho no qual a dexametasona mostrou-se capaz de reduzir em um terço o número de mortes entre pacientes entubados. Nesta quarta-feira, 2, a Organização Mundial da Saúde (OMS) publicou recomendações oficiais para que corticóides como a dexametasona e a hidrocortisona sejam usadas no tratamento de pacientes graves do novo coronavírus. "Recomendamos corticosteroides sistêmicos para o tratamento de pacientes com covid-19 em estado grave e crítico. Sugerimos não usar corticosteroides no tratamento de pacientes com quadros não severos de covid-19”, disse a entidade em nota. 

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