Diabete infantil: tratamento exige conhecimento e responsabilidade

Doença normalmente é autoimune e não pode ser prevenida; pais devem ficar atentos a sintomas como emagrecimento repentino e excesso de sede e apetite

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Por Ana Lourenço
Atualização:

Não é de hoje que a Pixar aborda assuntos complexos em seus filmes – daqueles bem acima da classificação indicada. Por trás das vozes infantis e músicas contagiantes, conversas sobre saúde mental, luto e até crescimento são levantadas. Red: Crescer É Uma fera, animação que ficou recentemente disponível na plataforma Disney+, é um bom exemplo disso. 

Criado pela diretora Domee Shi, o filme fala sobre a vida de Meilin, uma garota de 13 anos, que vira um grande panda vermelho quando fica nervosa. Mas muito além do processo de amadurecimento da personagem principal, basta um olhar atento para perceber a dedicação da marca em explorar a particularidade dos colegas de turma de Meilin. De tons de pele a condições médicas – como os dois coadjuvantes que exibem o adesivo de insulina no braço.

Alice Martins, de 6 anos: diagnosticada aos 3 anos, menina faz sozinha o controle de insulina. 'Aprendi com minha mãe' Foto: Felipe Rau/Estadão

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A presença dos dois ao longo do filme chamou a atenção de Alice Martins, de 6 anos, diagnosticada com diabete tipo 1 aos 3 anos. “Eu gostei da parte da menina do banheiro porque ela tem o adesivo que nem eu”, conta. “A aparição é rápida, mas quem vive aquilo consegue enxergar de longe a bomba de insulina que os personagens usam. A Alice ficou muito feliz”, completa a mãe, Andressa Martins. De acordo com a Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD), o Brasil é o terceiro país com mais casos de diabete tipo 1 (92.400 casos) – caracterizada pela destruição das células beta-pancreáticas, responsáveis pela produção da insulina –, abaixo da Índia e dos EUA. 

Doença autoimune

 “A diabete infantil, normalmente, está associada à diabete tipo 1, que é autoimune. Então não tem como a gente prevenir. O próprio diagnóstico é abrupto. Quando chega, a criança já emagreceu bastante, está com polidipsia (muita sede), micção excessiva, muita fome”, explica o presidente da SBD, Levimar Rocha Araújo.

A falta de informação ainda é uma dificuldade no tratamento. Tanto em relação à martirização dos pais, preconceito dos outros e falta de naturalização da doença. “A diabete que a gente está acostumada a ouvir é sempre do adulto, do idoso. Nunca imaginei que uma criança de 3 anos pudesse ter diabete. Ficava pensando se tinha algum alimento que eu dei demais, se poderia ter feito algo diferente. Demorou um tempo para eu aceitar”, diz Andressa. 

Educação é parte importante do tratamento

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A aceitação da própria criança é fundamental para o sucesso do controle do diagnóstico. “O tratamento da diabete exige o conhecimento sobre a doença, sobre aplicação de insulina e educação nutricional. Então, o paciente precisa saber quanto carboidrato vai consumir para cobrir aquilo com insulina”, ensina a pediatra e endocrinologista Tainara Emília. A médica explica de forma lúdica aos pacientes o que está acontecendo no corpo, citando um “exército de soldados” em vez de falar sobre células. “Vejo que quanto mais cedo eles aprendem, mais eles se envolvem.” 

No caso da Alice, sua autonomia é garantida com um sensor que é conectado no braço e mede o nível de insulina do sangue a cada 5 minutos. “Às vezes, doí quando levo a picadinha”, conta. O aparelho avisa sobre a hipoglicemia (baixa quantidade de açúcar) normalmente causada pela atividade física. “Aí como uma balinha ou tomo suco”, diz a menina. Se o dispositivo acusa a hiperglicemia (excesso de glicose), é preciso controlar os carboidratos. “Faço sozinha. Aprendi com a minha mãe.”

Para ajudar na divulgação da doença, Andressa usa suas redes sociais (@maededois) como canal de conhecimento. Lá, ela se chama de “mãe pâncreas”. “É no pâncreas que ficam as células beta-pancreáticas, produtoras de insulina. Então, quando a gente se torna uma mãe pâncreas, está tentando imitar essa função, como se fosse um órgão mesmo.”

Com os índices glicêmicos controlados, o paciente diabético tem uma vida normal – até mesmo em relação à dieta e à quantidade de macronutrientes (proteína, carboidratos e gorduras). É preciso, apenas, estar atento aos açúcares. “A alimentação de um diabético não tem de ter restrição. No caso de uma criança, tudo deve ser atendido conforme a necessidade nutricional da idade”, afirma Tainara. “Apesar disso, é comum alguns se sentirem diferentes na escola e irem ao banheiro escondidos para checar glicemia e aplicar a insulina. O filme traz a possibilidade de a gente abraçar o diagnóstico.”

  • O que é

Doença causada pela produção insuficiente ou pela má absorção de insulina, hormônio que regula a glicose no sangue, tem como consequência a elevação do nível de açúcar no corpo.

  • Consequências

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Se o açúcar do sangue não for controlado, o diabético pode ter problemas de visão, doenças cardiovasculares, insuficiência renal e necessidade de amputação de membros inferiores. 

  • Sintomas

Sede constante, vontade de urinar muitas vezes ao dia, alterações no apetite, perda de peso, fadiga, sono excessivo, visão embaçada. 

  • Causas

No caso do tipo 1, que é autoimune, não existe uma causa. Porém, o tipo 2 está diretamente relacionado ao sobrepeso, sedentarismo e hábitos alimentares inadequados. “Com o aumento da obesidade infantil, estamos vendo uma maior incidência dessa diabete também em jovens”, diz o presidente da SBD, Levimar Rocha Araújo.

  • Tratamento

Dieta, exercícios regulares e controle da glicose pela insulina são os mais comuns. Para essa última, existem duas possibilidades: esquema de múltiplas doses ou sistema de infusão contínua, que é a bomba de insulina.

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