Vacinas que sobram geram corrida a postos de saúde de SP; lista de espera tem até 500 nomes

Unidades têm filas e aglomerações em busca do imunizante contra a covid-19; Prefeitura orientou cadastro de idosos com mais de 60 anos e profissionais de saúde para evitar desperdício

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Foto do author Priscila Mengue
Por Priscila Mengue e João Prata
Atualização:

Parte das Unidades Básicas de Saúde (UBSs) da cidade de São Paulo tiveram de lidar nesta terça-feira, 23, com fila e aglomeração de quem buscava se cadastrar para a "xepa da vacina" contra o vírus da covid-19. Para evitar o desperdício no fim do dia (parte dos frascos contém cerca de 10 doses), a Prefeitura orientou as UBSs a abrirem cadastro para que idosos com mais de 60 anos e profissionais da saúde moradores da região possam receber essa sobra.

O problema é que a oferta é muito menor do que a demanda. Na UBS Sigmund Freud, em Moema, zona sul, até o fim da tarde havia mais de 500 cadastrados. Na Barra Funda, zona oeste, o Centro de Saúde Escola Barra Funda Alexandre Vranjace, está com lista de espera de mais de 300 nomes. Na Vila Alpina, zona leste, a UBS ressalta aos pacientes que a inscrição “não é garantia”, pois já ultrapassou os 150 cadastrados, enquanto o posto Jardim Aeroporto, na zona sul, informa aos pacientes que há “bastante” procura, com “muito mais” de 50 inscritos.

Moradores do bairro de Moema fazem fila para cadastro na 'xepa da vacina'. Foto: Daniel Teixeira/ Estadão

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Uma enfermeira da unidade de Moema informou que diariamente sobram, no máximo, duas doses. Para agilizar a produção da vacina, foram feitos frascos maiores, com dez doses em cada. Atualmente estão sendo vacinados pessoas com mais de 85 anos. Por volta das 18h, quando acaba a imunização oficial, se há sobra de vacinas, os profissionais da saúde telefonam para quem foi cadastrado, que tem cerca de uma hora para aparecer e receber o imunizante excedente.

Uma senhora de 60 anos parou o trânsito da Avenida Indianópolis, na zona sul, para entender o motivo da fila na unidade de Moema. Ela perguntou ao segurança se era para aplicação da vacina e disse já ter feito o cadastro. Com a SUV estacionada em fila dupla, ignorando as buzinas, tentou descer do carro para fazer novo cadastro. Insatisfeita por não colocar seu nome novamente na lista, avisou que apareceria mais tarde, perto das 19h. "Vai que a pessoa chamada não aparece, né? Aí aplicam em mim, porque ninguém vai jogar uma dose fora."

Posto de Saúde de Moema tem cerca de 500 pessoas na fila de espera pela sobra de uma dose de vacina. Foto: Daniel Teixeira/ Estadão

Marie Bonducki, 68 anos, disse que demorou 15 minutos na fila da UBS de Moema para fazer o cadastro. Soube da xepa pelas redes sociais, mas não estava muito confiante em receber a dose. "Com esse governo que é uma lástima, nunca se sabe o que vai acontecer."

No mesmo local, Vivian do Carmo, 64 anos, reclamou da bagunça. "Não custava nada, coloca uma faixa, indica um distanciamento. Está todo mundo aglomerado". Zeila Colesi, de 74 anos, comentou que o cadastro foi simples de fazer. "Tem muita gente, não sei se vai ter sobra para todo mundo. Mas a gente sempre tenta. De um jeito ou de outro espero tomar a vacina." 

Entre os vacinados com a sobra, palmas e foto nas redes

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Entre os que conseguiram aproveitar a "xepa", está a aposentada Olinda Martinez, de 67 anos, que recebeu a 1ª dose na quarta-feira, 17, dia seguinte ao que se cadastrou em um posto do Brooklin, zona sul. "Só tinham 10 pessoas na frente. Ontem (segunda-feira), passamos lá e já tinha 290 pessoas (na lista)", conta sobre o aumento na procura.

Olinda ainda conseguiu que o marido, também idoso, fosse vacinado, mas perdeu a chance de inscrever o pai, de 82 anos. “Se soubesse (que levaria alguns dias para a faixa etária dele ter a vacinação liberada), teria colocado antes de mim”, lamenta ela, que tomará a próxima dose em maio. A sensação é de que “ganhou na loteria”.

“Se fosse esperar a minha vez, talvez só no final de março.” Os conhecidos estranharam a situação. “Tirei foto e postei para todos os meus amigos. Perguntaram até se eu tinha pagado”, comenta. “Todo mundo me ligou, dizia 'graças a Deus, amiga, que você conseguiu'.”

A empresária Maria Helena Nader, de 77 anos, também conseguiu se vacinar em uma UBS, em Indianópolis, há cerca de uma semana. Conta que a filha viu uma pequena fila em frente ao posto e decidiu levar os pais. “Perguntei o que é a xepa? ‘É a vacina que sobra’, ela respondeu. Passei a mão na bolsa e fomos lá”, lembra. 

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Segundo ela, cerca de oito pessoas (entre profissionais de saúde e idosos fora do grupo prioritário atual) conseguiram tomar a vacina naquele dia. “Recebi a última que estava sobrando na geladeira”, comemora. “Cada vez que um tomava, eram palmas e uma gritaria. Fui abençoada!”

Secretaria não tem protocolo para criação do cadastro

A Secretaria Municipal de Saúde informou que não há um protocolo de como as UBSs devem realizar o cadastro. Em alguns locais, a orientação é para que o interessado vá presencialmente ao local para se inscrever, enquanto outros permitem que o cadastro seja feito por um familiar, desde que leve documento e comprovante de residência. Há outros, ainda, que permitem a inscrição até mesmo pelo telefone, desde que a pessoa leve a documentação exigida no momento da aplicação. 

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A medida não abrange todas as unidades. Na UBS Bom Retiro, no centro, e no Parque da Lapa, zona oeste, por exemplo, a lista de espera não foi criada, pois o imunizante administrado vem em frascos de dose única.

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