Em semana com pico de mortos por covid, Bolsonaro causa aglomeração e faz discurso negacionista

Presidente da República cumprimenta, sem máscara, apoiadores em São Francisco do Sul (SC) e volta a defender tratamentos sem eficácia para a covid-19

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Por André Shalders
Atualização:

BRASÍLIA - Na semana em que o Brasil registrou o maior número de mortes por covid-19 em um período de 24 horas desde julho, o presidente Jair Bolsonaro manteve o discurso negacionista a respeito da doença e causar aglomerações. Em declarações pelas redes sociais, também voltou a defender tratamentos sem comprovação científica e a questionar a validade de vacinas já aprovadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). 

O presidente Jair Bolsonaro chega cumprimenta apoiadores em São Francisco do Sul, Santa Catarina. Foto: Ivan de Leone/Prefeitura de São Francisco do Sul

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"Temos um vírus. Não negamos. Temos. Estamos preocupados. Hoje meus irmãos decidiram, estão votando aqui se a minha mãe (Olinda Bolsonaro) vai ser vacinada ou não, com 93 anos. Eu já dei lá, eu votei lá sim. Com 93 anos, deixar ela ser vacinada mesmo com uma vacina aí, não está comprovada cientificamente", disse o presidente em entrevista à TV Band. Diferentemente do que disse o mandatário, a Coronavac teve sua eficácia comprovada por testes clínicos.

Na mesma entrevista, pouco antes de condicionar a vacinação da mãe a uma votação, o presidente já havia se declarado "a favor" da imunização, embora já tenha repetido, por diversas vezes, que não vai se vacinar.

O novo coronavírus, que já matou mais de 230 mil brasileiros, também foi praticamente ignorado na agenda oficial do presidente da República. Ele teve um único compromisso relacionado ao assunto durante a semana: uma reunião com Antônio Barra Torres, diretor-presidente da Anvisa. Nos pronunciamentos, o presidente da República se mostrou pouco preocupado com o vírus: o termo "covid-19" aparece uma única vez nos discursos públicos de Bolsonaro registrados pelo site da Presidência desta semana.

Na quinta-feira, 11, dia em que o Brasil contabilizou 1.452 óbitos por covid-19, Bolsonaro defendeu o uso de um tratamento experimental contra o câncer no enfrentamento ao novo coronavírus. A droga, chamada EXO-CD24, foi desenvolvida em Israel e é aplicada por meio de um spray nasal. O fármaco apresentou bom resultado quando aplicado num pequeno grupo de 30 pessoas, mas o número é insuficiente para se tirar qualquer conclusão sobre sua eficácia. Mesmo assim, o presidente disse que o medicamento teve "sucesso" e discuti importá-lo.

Na sua live semanal, na quinta-feira, 0 presidente também criticou o que chamou de "pilha da vacina". "Quando eu falei de remédio lá atrás, levei pancada. Nego bateu em mim até não querer mais. Entrou na pilha da vacina. O cara que entra na pilha da vacina, só a vacina, é um idiota útil. Nós devemos ter várias opções", disse o presidente. "Se Deus quiser, amanhã, encontro nosso Benjamin Netanyahu para tratar desse assunto", disse.

Ontem, 12, Bolsonaro voltou a tratar do assunto. "Conversei há pouco com o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu. Dentre outros assuntos, tratamos da participação do Brasil na 3ª fase de testes do spray EXO-CD24, medicamento israelense que, até o momento, vem obtendo grande sucesso no tratamento da covid-19 em casos graves", escreveu o presidente no Twitter.

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Neste sábado, ao chegar em São Francisco do Sul, em Santa Catarina, mais uma vez provocou aglomerações ao parar para cumprimentar, sem máscara, apoiadores. Tirou fotos e pegou crianças no colo. O distanciamento social é recomendado por autoridades de saúde para evitar a propagação do vírus enquanto nem todos foram vacinados. 

Legislativo e Judiciário

No Congresso, cresce o movimento de senadores que desejam iniciar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre a postura do governo federal na pandemia. A possibilidade de que a CPI seja instalada aumentou depois do depoimento do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, aos senadores.

No Judiciário, a conduta de Pazuello é investigada em um inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF), aberto pelo ministro Ricardo Lewandowski no fim de janeiro. O objetivo é apurar o colapso do sistema de saúde em Manaus, no Amazonas, onde pelo menos trinta pacientes de covid-19 morreram em janeiro em decorrência da falta de oxigênio hospitalar.

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Importância das máscaras e da vacina

Profissionais de saúde reafirmam a importância do uso de máscaras, medidas de distanciamento social e vacinação para o combate ao novo coronavírus, e alertam sobre o risco da automedicação.

"Diante da dramática situação provocada pela pandemia da covid-19, são dois grandes eixos para reduzir o impacto e o sofrimento da população. Primeiro, a manutenção das medidas de proteção individual, incluindo o distanciamento social, a higiene pessoal e o uso da máscara. E segundo, a vacinação", disse Rivaldo Venâncio da Cunha, médico infectologista e pesquisador da Fiocruz.

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"Como recomendado para todas as outras doenças, alertamos também para o risco da automedicação, que deve ser evitada sempre", disse ele, referindo-se a tratamentos sem eficácia comprovada contra a doença. O médico ressaltou que fala em caráter pessoal, e não em nome da instituição. / COLABOROU DANIEL WETERMAN