PUBLICIDADE

Hábito de lavar as mãos revolucionou a medicina

Higienizar as mãos com frequência pode parecer pouco diante da pandemia de coronavírus, mas é a melhor forma de se prevenir contra a infecção

Foto do author Roberta Jansen
Por Roberta Jansen
Atualização:

RIO - Especialistas do mundo inteiro concordam: lavar as mãos com frequência é a melhor forma de se prevenir contra a infecção pelo novo coronavírus. Pode parecer muito pouco diante de uma pandemia que já matou quase 5 mil pessoas e ameaça a economia mundial. Essa medida prosaica, porém, foi uma das mais revolucionárias de toda a história da medicina.

Hábitos simples de higiene, como manter as mãos limpas, estão tão entranhados na rotina que muitos pensam que sempre foi assim. Engano. Em meados do século XIX, os médicos não tinham o costume de lavar as mãos, nem mesmo entre procedimentos cirúrgicos. Vírus e bactérias não tinham ainda sido descobertos, e a ideia predominante era que as doenças eram transmitidas pelo ar.

Pessoas lavam as mãos em um lavatório portátil em El Salvador com o objetivo de prevenir o novo coronavírus. Foto: Jose Cabezas/Reuters

PUBLICIDADE

“Na verdade, a ideia dominante era que a lavagem poderia tirar a proteção da pele”, explicou a pesquisadora Gisele Sanglard, da Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz, especialista em história da saúde. “Vamos lembrar que estamos falando de países do Hemisfério Norte, onde os invernos são mais rigorosos, não havia calefação, e tomar banho era um sacrifício. Essas medidas de higiene vão sendo inseridas aos poucos no cotidiano das pessoas, como o passar dos tempos. Mas foi um longo processo.”

O primeiro médico a perceber que a lavagem das mãos poderia ter um impacto respeitável nas taxas de letalidade foi o húngaro Ignaz Semmelweis (1818-1865) que em 1847 trabalhava no Hospital Geral de Viena. O hospital tinha duas clínicas para a realização de partos: uma que era usada no ensino de jovens médicos e outra para o treinamento de parteiras.

A morte de mulheres pela chamada febre puerperal, pós-parto, era muito comum. Mas o médico começou a observar uma diferença de mortalidade muito grande entre as parturientes atendidas por estudantes de medicina e as que eram cuidadas por parteiras. Entre essas últimas, a taxa de letalidade era de menos de 4% contra porcentuais que chegavam a 16%.

Nesta mesma época, um médico amigo de Semmelweis morreu depois de ter sido ferido acidentalmente pelo bisturi de um dos estudantes da clínica durante um exame de necropsia.Ao fazer a autopsia do amigo, Semmelweis notou que ele morrera de uma enfermidade muito parecida à que acometia as parturientes.

A teoria dos germes não havia ainda sido lançada. Semmelweis, tendo excluído todas as outras diferenças entre as duas clínicas, concluiu que os médicos que faziam autópsiasestariam levando para as novas mães “partículas cadavéricas” nas mãos. Isso explicava por que as parteiras tinham porcentuais mais baixos: elas não participavam das autópsias.

Publicidade

Diante disso, o médico estabeleceu uma nova política no hospital. Os estudantes deveriam lavar as mãos depois da autópsia, antes de atenderem as parturientes. O resultado foi imediato e espantoso. Em apenas um mês, o porcentual de mortes caiu para menos de 1%.

Semmelweis chegou a publicar um livro, “Etiologia, Conceito e Profilaxia da Febre Puerperal”. Suas descobertas, porém, não foram bem recebidas entre os médicos. Pelo contrário, muitos zombavam dele. Suas ideias eram o oposto do preconizado e foram rejeitadas pela comunidade científica. Ele morreu aos 47 anos depois de ter tido um colapso nervoso e ser internado em um hospital psiquiátrico.

“Ele morreu porque não acreditaram em suas descobertas”, resumiu o infectologista Stefan Cunha Ujvari, do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, autor do livro “A História da Humanidade Contada Pelos Vírus”.

Foram necessários ainda alguns anos até que o francês Louis Pasteur confirmasse a teoria dos germes e o britânico Joseph Lister começasse a colocá-la em prática com medidas de higiene durante procedimentos cirúrgicos.

Receba no seu email as principais notícias do dia sobre o coronavírus. 

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.