Hospitais realizam sonhos de pacientes com doenças graves

De viagem para Cuba a casamento, equipes de cuidados paliativos diversificam o trabalho para cuidar dos lados clínico e emocional

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Por Fabiana Cambricoli
Atualização:

SÃO PAULO - O que é importante para você? A pergunta tem se tornado cada vez mais frequente no questionário médico de grandes hospitais de São Paulo. Se em algumas unidades de saúde as equipes de cuidados paliativos trabalham apenas na redução da dor e do desconforto de doentes terminais, hospitais de referência estão investindo em um serviço mais amplo, que acolhe o paciente em qualquer estágio da doença ou aspecto da sua vida: clínico, emocional, social e espiritual.

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Para a comerciante Carla Maria Fernandes Carneiro, o importante era realizar o sonho de conhecer Cuba. Diagnosticada com um câncer grave no estômago em 2013, a paciente do Sírio-Libanês pediu ajuda à equipe de cuidados paliativos do hospital para tornar possível a viagem.

“No começo houve um certo receio porque ela estava muito fraquinha, mas a equipe viu que aquilo era realmente importante para ela e montou todo um plano, com um voo com paradas, preparou toda a comida que ela deveria consumir lá e fez um seguro para que ela pudesse ser transferida para Miami se algo desse errado”, conta a mãe de Carla, a administradora Marly Condeixa Fernandes, de 70 anos.

“No final, foi uma coisa maravilhosa: ela dançou, passeou, se divertiu. E todo esse acolhimento foi trazendo mais serenidade para ela e para nós, até mesmo para superar a partida dela”, diz Marly. Carla morreu aos 47 anos, em agosto do ano passado, dois meses depois de conhecer Cuba.

Para Daniel Neves Forte, médico da equipe de cuidados paliativos do Sírio, o desafio é ampliar o olhar médico para além da doença. “Em toda a nossa formação, a gente estuda como tratar a doença, mas focar apenas nisso deixa de fora a pessoa, suas emoções, geografias, relações pessoais, o contexto de vida dela. E é aí que entram cuidados paliativos”, defende.

Em hospitais como o Sírio, Albert Einstein e A. C. Camargo, as equipes de cuidados paliativos têm ampliado sua atuação para além dos pacientes com doenças incuráveis e atendido doentes com problemas com um bom prognóstico, mas que causam grande sofrimento. No Einstein, o serviço, antes voltado apenas para pacientes oncológicos, foi ampliado no ano passado para pessoas com outras doenças e terá, no ano que vem, equipe específica para crianças e adolescentes. No A. C. Camargo, o número de pessoas atendidas pelo serviço cresce cerca de 20% ao ano.

Batismo. Em todos os hospitais, as equipes atendem às mais diferentes necessidades dos pacientes, desde amenizar sintomas até autorizar o consumo de uma feijoada ou pizza ou realizar um casamento. Esse foi o pedido da secretária Rita Alves Pereira Higa, paciente do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp), unidade da rede pública referência em cuidados paliativos.

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Evangélica, ela queria casar-se com seu companheiro de dez anos e ser batizada conforme a tradição da igreja que frequentava, em uma piscina. “Eles inflaram uma piscina no hospital, os enfermeiros ajudaram a encher de água e fizemos a cerimônia do casamento e do batismo lá mesmo. Ela ficou muito feliz”, conta o vendedor Tadeu Rodrigues Martins, de 58 anos, marido de Rita. A paciente morreu uma semana após casar, aos 55 anos.

A mulher de Tadeu Rodrigues Martins quis realizar casamento e batismo antes de morrer Foto: Clayton de Souza/Estadão

“Esse acolhimento é importante. Valorizar os sintomas, tentar entender as origens da angústia. Nenhum profissional de saúde é treinado para se comunicar bem, mas a gente tem de aprender a ouvir”, diz Toshio Chiba, chefe do serviço de cuidados paliativos do Icesp.

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