Hospital de referência de Manaus tem UTI lotada de pacientes com sequelas da covid-19

No local, 60% das vagas são usadas por aqueles já não estão mais com o vírus, mas ainda sofrem com reflexos da doença

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Por Ludimila Honorato e Bruno Tadeu
Atualização:

MANAUS - Referência no tratamento contra a covid-19 em Manaus, o Hospital Delphina Aziz tinha 96% de ocupação dos leitos de UTI nessa segunda-feira, 26. Das 90 vagas, aproximadamente 60% estão ocupadas por pacientes que não têm mais a doença, mas seguem em recuperação das sequelas deixadas pela doença, como dificuldades de respirar e problemas renais. No Amazonas, houve restrição à circulação de acompanhantes e visitantes em hospitais e unidades de saúde para evitar o avanço da transmissão do novo coronavírus. 

O perfil que precisa desse atendimento é um paciente que ficou enfraquecido, em decorrência da doença e do longo período de internação Foto: Tiago Queiroz/Estadão

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“É um paciente que teve seu quadro de diabete agravado, é um paciente que teve a questão renal comprometida. Tem paciente que está há mais de quatro meses lá no Hospital Delphina Aziz, e que precisa de um leito de UTI”, explicou o governador Wilson Lima (PSC) esta semana. O Amazonas foi um dos Estados mais atingidos pela pandemia, com quase 4.480 mortes. 

Conforme a Secretaria da Saúde, a reabilitação de pacientes com sequelas é feita com acompanhamento de equipe multidisciplinar, nas áreas de Enfermagem, Fonoaudiologia, Nutrição e Psicologia. O fluxo de acesso ao ambulatório ocorre com entradas de pacientes que estavam internados no próprio hospital e encaminhados de outras unidades. Nos hospitais de referência para a covid-19 do Estado, as visitas foram suspensas. O mesmo vale para unidades em que não há separação do fluxo de outros doentes e seus acompanhantes. 

O coordenador de fisioterapia do Delphina Aziz, Érick Paiva, explica que o perfil que precisa desse atendimento é um paciente que ficou enfraquecido, em decorrência da doença e do longo período de internação. A faixa etária mais comum é entre 45 e 60 anos. “São pacientes que, por conta da covid-19, tiveram internação prolongada, e em decorrência disso tiveram um declínio funcional muito grande, perderam capacidade de independência. Então, nossa proposta é reabilitá-los em cima dessas funcionalidades”, disse.

Ele explica, ainda, que a maioria dos pacientes até consegue se manter respirando normalmente, se estiverem em repouso. Quando é exigida demanda metabólica um pouco maior, como por exemplo, caminhar, escovar o dente em pé e tomar banho, os pacientes começam a apresentar desconforto, cansaço, tendo de interromper a atividade para recuperar o fôlego, e é em cima desses pontos que o profissional atua.

Aos 69 anos, a funcionária pública afastada Terezinha Roberta Matias lida diariamente com o tratamento de uma fibrose pulmonar. O filho Celio Matias, de 36, preferiu evitar a internação hospitalar da mãe e optou pelo tratamento em casa. “Pagamos um aparelho chamado concentrador de oxigênio para ela. Tem dias que dá crise de falta de ar. Às vezes, o paladar ainda tem falhas, mas também tem dias que ela está bem”, descreveu ele.

Para o infectologista Bernardino Albuquerque, da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), o aumento de casos de sequelas da covid - cardíacas, pulmonares e renais, entre outras - é motivo de alerta. É importante, defende o médico, uma estratégia de "criar locais onde se possa acompanhar esses pacientes, não somente de forma hospitalar, mas ambulatorial, para que se tenha um êxito maior". 

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Ocupação hospitalar preocupa

De acordo com boletim de ocupação das unidades hospitalares da terça-feira, 27, do governo do Amazonas, 77% dos leitos de UTI e 70% dos leitos clínicos estavam ocupados. O Estado evita considerar uma segunda onda de contaminações no Amazonas, como tem ocorrido em vários países da Europa, mas anunciou nesta terça-feira, 27 a prorrogação do decreto que proíbe a abertura de bares e balneários por mais 30 dias.

Henrique Pereira, também especialista da Ufam, diz que houve uma "explosão" no número de internações em Manaus nas duas últimas semanas. "O número de internações diárias em Manaus, em outubro, apresenta valores duas a três vezes maiores do que em julho, agosto e setembro." Segundo ele, média móvel de sete dias ficava próxima a 15, variando entre 10 e 20, até o mês passado, mas agora está em torno de 30 e já alcançou 45 em um único dia. Ao analisar indicadores de casos, internações e óbitos na cidade, a variação de agosto em relação a julho foi negativa, o que indicava tendência de declínio. "Desde setembro, a variação vem sendo positiva (tendência de aceleração nos três indicadores) e em outubro ganha destaque o grande crescimento da internações,de 80% em relação ao mês anterior, faltando apenas três dias para fecharmos o total mensal, o que já permite uma boa avaliação do mês." O número de casos acumulados passou de 8.423 em julho para 6.854 em agosto, 9.179 em setembro e 10.277 neste mês apenas em Manaus. Porém, até o momento, Pereira diz que ainda não houveaumento na mesma proporção de óbitos. mas a expectativa é que haja incremento no total de mortes na cidade nas próximas duas semanas. "Observando os dados, calculamos que o número de óbitos em uma determinada semana corresponde, em média, à metade das internações ocorridas há duas semanas."

Na opinião de Albuquerque, apesar da curva de aumento de infecções, ainda não é possível dizer que o Estado vive uma 2ª onda. Mas, diante da flexibilização do isolamento social, ele classifica como "dramático" o momento atual. 'Temos de nos preparar para que esse segundo momento não aconteça como o primeiro." 

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