21 de maio de 2017 | 03h00
SÃO PAULO - Uma semana após a filha completar um ano, a confeiteira Maria (nome fictício), de 27 anos, recebeu uma ligação do posto de saúde dizendo que algumas vacinas da criança estavam atrasadas. Ela disse que não faria a imunização por medo de possíveis reações. No mesmo dia, recebeu uma visita do Conselho Tutelar.
“O enfermeiro me denunciou e os conselheiros bateram na minha casa, dizendo que eu era obrigada a dar a vacina. Eu imprimi a bula da vacina do rotavírus, notícias que diziam que ela tem metais pesados e ligação com o autismo”, conta a mãe. Todas as informações que ela apresentou haviam sido obtidas em grupos de Facebook.
Como os conselheiros disseram que ela corria o risco de perder a guarda da filha, Maria levou a menina no mesmo dia para ser vacinada. “Eu chorava mais do que ela enquanto davam as injeções. Eu sou a mãe e tenho direito de decidir como cuidar da minha filha. Ela é saudável, não precisa de vacina.”
Responsabilização. Ricardo Cabezón, presidente da Comissão de Direitos Infantojuvenis da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP), explica que, ao não vacinar os filhos, os pais podem ser responsabilizados civil e penalmente, já que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) estabelece como obrigatória a vacinação das crianças nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias.
“É prerrogativa do pai e da mãe conduzir a educação do filho, com a condição de não desvinculá-la das responsabilidades que têm com a criança. A saúde é tida como um direito fundamental e, por isso, é um dever dos pais garanti-la.”
Cabezón diz que, caso os pais não queiram vacinar, é preciso obter uma autorização judicial. “Com argumentos científicos e expondo sua posição, os pais podem solicitar na Justiça a liberação. O que não pode é pensar que vai tomar essa decisão por conta própria e risco. Ao não vacinar, não há riscos apenas para o filho, mas para os outros, já que a criança se torna um agente propagador de doenças. É uma questão de saúde pública.”
De acordo com ele, quem não cumpre o calendário de imunizações está sujeito a multa de 3 a 20 salários mínimos por descumprir dolosa ou culposamente deveres familiares, além de estar sujeito a perder a guarda da criança.
“Aos pais, é assegurado o cuidado dos filhos, eles não são objetos de pertencimento. O que muitos não entendem é que há limites em seus direitos familiares”, explicou o advogado.
Maria, que pediu para não ser identificada por temer ser novamente denunciada ao Conselho Tutelar, tem mais uma filha, de 10 anos, e está grávida pela terceira vez. Ela disse não querer dar mais nenhuma vacina a nenhum de seus filhos. “Todas as vacinas são perigosas, vou dar apenas se for forçada novamente”, afirmou.
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