Covid avança em 24 Estados e no DF; média móvel de casos dobra em duas semanas

Número ainda está distante do que foi visto no pico da Ômicron, mas pode haver subnotificação por causa de autotestes e problemas com a divulgação de dados pelos Estados

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Foto do author Leon Ferrari
Por Leon Ferrari
Atualização:

Nas últimas duas semanas, a média móvel de casos de covid-19 aumentou em 24 Estados e no Distrito Federal. A média do País cresceu 100,3% no período, conforme dados do consórcio de veículos de imprensa. O número que era de 14.644, no dia 22 de maio, passou para 29.342 no domingo, 6, após oito dias de alta. Com isso, voltou aos níveis do final de março deste ano

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O número ainda está distante do que foi visto no pico da Ômicron. Porém, o cenário de alta pode estar subnotificado por causa de autotestes e irregularidades na divulgação de dados pelos Estados.

Especialistas falam sobre a possibilidade de uma nova onda e atribuem alta à transmissibilidade da Ômicron e de suas subvariantes; à flexibilização de medidas não farmacológicas de proteção; à estagnação e a desigualdade regional da vacinação; e ao frio. Eles indicam a necessidade de estímulo à imunização e a retomada do uso de máscaras em locais fechados.

Como mostrou o Estadão, frente ao aumento de infecções, cidades voltam a recomendar uso de máscara e escolas a adotarem ensino remoto.

Profissional de Saúde faz teste em paciente Foto: Tiago Queiroz/Estadão

No País, a média de casos, que exclui distorções do final de semana, caiu acentuadamente entre fevereiro, quando ultrapassava a casa dos 100 mil, e a primeira quinzena de abril. Até o final de maio, o número ficou relativamente estável, abaixo dos 20 mil. Porém, a partir do dia 26 do mês passado, recrudesceu por oito dias seguidos. Atingindo 32.983 em 2 de junho.

Em relação às mortes pela doença, nas últimas duas semanas, houve queda de 21,5% na média móvel e está em 80. O número está abaixo de 100 desde 3 de junho, após ter passado nove dias consecutivos acima.

O boletim Boletim InfoGripe Fiocruz mostrou que a covid-19 responde por 59,6% dos casos de Síndrome Respiratória Aguda (SRAG) com identificação viral nas últimas quatro semanas (de 1º a 28 de maio). Entre 20 de março e 16 de abril, período com o menor porcentual, a covid correspondia a 34,1%.

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Entre as unidades federativas, os maiores aumentos nas duas últimas semanas foram no Acre (1800%), no Rio Grande do Norte (621,4%), em Roraima (400%), no Distrito Federal (383,7%) e no Rio de Janeiro (283,9%). Amazonas (-33,3%) e Sergipe (-6,6%) foram os únicos a apresentar queda.

Em São Paulo, a variação de duas semanas foi de 45,6%. No domingo, a média móvel de infecções foi de 3.591, após 11 dias de crescimento. O número chegou a ser de 5.799 em 2 junho. 

Internações

Em um período de um mês, o número de internados por covid-19 subiu até 275% em hospitais privados de São Paulo, mas está longe do que foi visto no pico da Ômicron. Com o avanço da vacinação, especialistas dizem que há risco bem menor de haver um salto na quantidade de pacientes graves. 

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Diante do avanço da transmissão, no entanto, o Comitê Científico do governo estadual recomendou a volta do uso de máscaras em ambientes fechados. A proteção, porém, segue sendo exigida por lei apenas em unidades de saúde e no transporte público.

A alta também preocupa nas escolas paulistas. Algumas chegaram a suspender aulas de turmas com registros de contaminação e a recorrer outra vez ao ensino remoto como alternativa. Isso ocorre tanto em colégios particulares, que têm regras distintas, quanto em escolas da rede municipal, que seguem protocolo da Prefeitura, que voltou a recomendar o uso de máscara em ambientes de ensino.

Estado de emergência em Santa Catarina

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Santa Catarina viu, em duas semanas, um aumento de 95,6% na média. No domingo, o número chegou a 1.810. O recrudescimento começou no dia 20 de maio, quando as novas infecções diárias eram de 750. 

Com a superlotação da rede hospitalar, o governo catarinense decretou situação de emergência pelo prazo de 90 dias na sexta-feira, 3. A sobrecarga deve-se, principalmente, pela escalada de doenças infecciosas e respiratórias, além de casos de dengue.

No Distrito Federal, o aumento foi de 383,7% em duas semanas. O recrudescimento começou na segunda quinzena de maio. Para se ter uma ideia, a média que era de 185 no dia 14 de maio, foi de 1.756 no domingo. No Rio, o crescimento foi de 283,9%. 

Em alguns Estados, a média cresceu mais do que 100% em duas semanas. Alagoas apresentou aumento de 132,1%. No Ceará, o crescimento foi de 147,9%. Mato Grosso viu recrudescimento de 167,7%. 

Nova onda de casos 

Os especialistas ouvidos pelo Estadão acreditam que o País possa estar enfrentando uma nova onda de casos. Na visão deles, a alta tem sido puxada pela alta transmissibilidade da Ômicron e suas subvariantes; estagnação e desigualdade regional da vacinação; redução de medidas não farmacológicas de proteção; e ao frio - que faz pessoas ficarem mais próximas e em ambientes fechados. 

“Vimos primeiro essa subida ainda em abril”, diz o coordenador da Rede Análise Covid-19, Isaac Schrarstzhaupt, citando a pesquisa Covid Trends and Impacts Survey, da Universidade de Maryland em conjunto com o Facebook. “As pessoas respondem essa pesquisa informando se estão sentindo sintomas, e essa curva sempre antecipa as curvas oficiais em 15 a 20 dias, e desta vez não foi diferente.” 

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Schrarstzhaupt aponta que Argentina, Chile e Uruguai também apresentaram “aumentos exponenciais de casos”. “Todos na mesma época. Corroborando mais ainda o fato de que é uma onda.”

O epidemiologista Pedro Hallal destaca que o aumento nas infecções mostra que a pandemia ainda não acabou, mas não é “deseperador”. “Porque a gente tem visto que o aumento de casos praticamente não vem acompanhado de um aumento de óbitos. Isso torna a situação muito melhor.” No entanto, ele pede cautela, levando em consideração a imprevisibilidade do novo coronavírus e a covid longa. 

Schrarstzhaupt, porém, lembra que o número de óbitos é um “indicador tardio”. “Durante o mês de maio já víamos esse aumento nas regiões Sul e Sudeste, e hoje já vemos em todas as regiões do País. Nas regiões Sul e Sudeste, que começou antes, já vemos aumento de hospitalizações em leitos clínicos e aumento leve em UTI em São Paulo e Rio Grande do Sul”, alerta.

As vacinas também têm papel importante ao reduzirem, principalmente, casos graves e mortes.Marcelo Otsuka, infectologista e vice-presidente do Departamento de Infectologia da Sociedade de Pediatria de São Paulo (SPSP), chama atenção para a estagnação dos níveis de imunização - principalmente de crianças, adolescentes e de reforço para idosos. "A cobertura vacinal ainda não é completa, não é adequada. Temos regiões em que a cobertura é muito falha.”

Com isso, os especialistas indicam a necessidade de estímulo à vacinação. E sugerem a retomada da recomendação de uso de máscara em local fechado. “Se o cenário seguir como está, acho que vale dar uma pensada se não valeria a pena, pelo menos, por um tempo, até esses números baixarem, a gente voltar a trabalhar com essa possibilidade (de máscara em local fechado)”, pondera Hallal. 

Ainda, fica mais evidente a necessidade de atualização de vacinas, uma vez que a Ômicron apresenta taxa de escape vacinal superior a outras variantes já enfrentadas. “O caminho das doenças, tipo a covid, é esse. As vacinas vão se atualizando. É o que a gente já esperaria de uma doença viral de transmissão tão rápida como essa”, fala Hallal. 

Autoteste e subnotificação

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Hallal destaca que, da forma que foi implementado no País, o autoteste se tornou uma "gigantesca fonte de subnotificação”. “Ninguém reporta para o sistema de vigilância”, diz. “Não adianta nada ficar fazendo teste e isso não dialogar com o sistema de vigilância. Se o sistema de vigilância não se beneficia das informações geradas pelo teste, é inútil.” 

Ao Estadão, a Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias (Abrafarma) disse não ter dados sobre a venda de autotestes por associados, apenas dados de pacientes que voluntariamente utilizaram o QR Code nas caixas dos testes para relatar o diagnóstico por aplicativo. Entre março e abril, 32 mil pessoas acessaram a aplicação. A maioria (88%) apresentou resultado negativo.

A associação disse que o autoteste é exercício de “cidadania” e “bom senso”. Também destacou esperar que pacientes que apresentem resultado positivo busquem profissional da saúde, para receber tratamento e notificar diagnóstico.

A Secretaria de Saúde do Rio, além do crescimento dos casos, viu aumento de 5% nos atendimentos a casos de síndrome gripal em UPAs. “Na semana de 15 a 21 de maio, foram em média 374 atendimentos diários de pacientes com síndrome gripal, sendo 237 pediátricos. Na semana de 22 a 28 de maio, a média diária de atendimentos foi de 396, sendo 238 pediátricos.”

Conforme a pasta, a Subsecretaria de Vigilância e Atenção Primária à Saúde (SWAPS) enviou nota técnica aos 92 municípios, na sexta, 3, alertando para que as unidades de saúde mantenham a oferta de teste rápido de antígeno para todos os casos de síndrome gripal, para monitoramento do cenário. 

O Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) destacou, em nota, que “não temos elementos para afirmar que estamos vivendo uma nova onda avaliando os dados das últimas semanas, mesmo considerando um aumento dos casos de forma significativa”. O Conass destacou que medidas de proteção “sempre devem ser incentivadas”, bem como estimular a vacinação é importante.

A reportagem tentou contato com o Ministério da Saúde, mas não obteve resposta até a publicação do texto. A secretaria de saúde do Rio Grande do Norte também não respondeu. O Distrito Federal disse monitorar todos os casos de covid-19 e demais síndromes respiratórias agudas graves (SRAG).

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