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Nicolelis usa trabalhos antigos para mostrar nova produção de instituto

Cientista divulga lista de pesquisas que comprovaria produtividade de equipe de 6 cientistas em Natal; análise confirma 'apagão científico'

Por Herton Escobar
Atualização:

O neurocientista Miguel Nicolelis divulgou ontem uma lista de sete trabalhos científicos publicados desde 2011 por cientistas ligados ao Instituto Internacional de Neurociências de Natal Edmond e Lily Safra (IINN-ELS). A relação, divulgada no site da instituição em resposta à reportagem publicada no domingo pelo Estado, teria como objetivo demonstrar a produtividade científica do IINN-ELS no último um ano e meio, desde o rompimento que ocorreu entre Nicolelis e a antiga equipe de pesquisadores do instituto, entre julho e agosto de 2011.Nicolelis foi procurado ontem via e-mail e telefone para comentar os dados, mas não respondeu. Desde domingo, o cientista tem se manifestado intensamente, mas apenas pelo seu Twitter. A reportagem de domingo do Estado revelou um "apagão científico" do IINN-ELS após o "racha" e trouxe à tona uma série de críticas e questionamentos da comunidade científica sobre os projetos de Nicolelis no Rio Grande do Norte. Entre elas, a crítica de que Nicolelis produz pouca ciência no Brasil, apesar de receber, individualmente, recursos públicos em valores muito acima dos padrões para a ciência nacional. Ao comentar o "racha" em agosto de 2011, Nicolelis disse que a saída da equipe anterior não representaria nenhum prejuízo à produção científica do IINN-ELS e o novo time do instituto teria a participação de 31 cientistas estrangeiros. A equipe que consta hoje no site do IINN-ELS é composta de seis pesquisadores brasileiros.Uma análise criteriosa dos sete trabalhos listados ontem por Nicolelis indica que todos são resultados de pesquisas anteriores ao "racha", produzidas em sua maior parte pelos cientistas que deixaram o IINN-ELS e migraram para o Instituto do Cérebro (ICE) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Cinco dos sete artigos foram publicados ou submetidos para publicação antes de agosto de 2011, segundo as informações bibliográficas disponíveis nos próprios trabalhos. Os outros dois, publicados em março e agosto de 2012 na revista Neuroscience, tem dez autores no total, representando cinco instituições. Desses, apenas um faz parte da equipe atual de pesquisadores do IINN-ELS, o biólogo Marco Freire, que assina os trabalhos em nome do IINN-ELS e da Universidade Federal do Pará (UFPA), onde fez seu mestrado e doutorado. Todos os outros autores são pesquisadores de outras instituições ou que deixaram o IINN-ELS, sugerindo que os trabalhos, apesar de terem sido publicados em 2012, representam linhas de pesquisa mais antigas, desenvolvidas em sua maior parte no período anterior ao esvaziamento do instituto.ParticipaçãoNicolelis divulgou ontem também uma lista de 18 trabalhos publicados por ele em 2011 e 2012. Uma análise dos dados bibliográficos indica que, em 17 deles, Nicolelis é o único autor afiliado ao IINN-ELS. Todos os outros são pesquisadores de instituições estrangeiras - a maioria da Universidade Duke, nos EUA, onde ele é professor titular e chefia um grande laboratório de neurociências. Várias fontes ouvidas pelo Estado na comunidade científica brasileira questionam o crédito dado ao IINN-ELS nesses trabalhos, com o argumento de que Nicolelis raramente está presente no instituto e, portanto, é improvável que tenha feito experimentos ele mesmo em Natal.O único trabalho entre os 18 que têm outro autor afiliado ao IINN-ELS é um artigo publicado em novembro de 2010 na revista Journal of Neuroscience Methods, em parceria com o atual diretor científico do instituto, Rômulo Fuentes. E um dos trabalhos é um artigo na revista Scientific American, que não conta como produção científica.Nicolelis divulgou ainda uma lista com 16 resumos de trabalhos apresentados em congressos pela equipe do IINN-ELS em 2012. Eles servem como um indicador da produção científica que está em curso no instituto, mas não trazem, necessariamente, dados científicos novos nem são garantia de publicações científicas no futuro.SeparaçãoO rompimento da equipe anterior com o IINN-ELS teria sido motivado pela personalidade difícil de Nicolelis, que, mesmo sem estar presente a maior parte do tempo no instituto, controlava rigorosamente todas as atividades a distância.Mais de 90 cientistas, técnicos e alunos deixaram o IINN-ELS entre julho e agosto de 2011. A maioria migrou para o Instituto do Cérebro da UFRN, onde continua a trabalhar.Desde então, a equipe de pesquisadores residentes do IINN-ELS foi reduzida a seis pessoas, uma pós-doutoranda e dois alunos de doutorado, ocupando uma infraestrutura de 12 laboratórios e biotérios, em dois prédios (um em Natal e outro, em Macaíba), financiada com milhões de reais em recursos públicos federais e estaduais.O custo para montar e equipar os dois prédios teria sido da ordem de R$ 12,5 milhões. Além disso, o Ministério da Educação (MEC) está financiando um projeto de R$ 48,1 milhões para construção de mais uma estrutura de pesquisa e ensino da UFRN na região rural de Macaíba. O projeto, conhecido como Câmpus do Cérebro, foi concebido e é coordenado por Nicolelis. O MEC prevê a inauguração para 2015.

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