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'O zika supera a capacidade dos países'

Para ministro da Colômbia, 2º país mais afetado pelo vírus, avanço da doença não está relacionado com sistemas de saúde pública

Por Rodrigo Cavalheiro
Atualização:
Gaviria sugeriu que os casais que estejam pensando em filhos adiem o plano Foto: REUTERS/Andres Stapff

MONTEVIDÉU - O ministro Alejandro Gaviria Uribe conseguiu no último mês tirar do noticiário de seu país a etapa final do processo de paz com a guerrilha das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). Com perfil mais inclinado ao de um político que ao de um sanitarista, esse economista anunciou algumas das orientações com maior repercussão internacional no combate ao zika vírus, que já infectou 20 mil colombianos - o país projeta 600 mil casos este ano. 

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Gaviria sugeriu que os casais que estejam pensando em filhos adiem o plano, orientou habitantes das áreas mais altas a não visitarem a regiões mais baixas e desaconselhou viagens a outros países com focos da infecção. Defendeu que uma gestante tem direito de abortar, em decisão conjunta com um médico, se enxergar na gravidez de uma criança com microcefalia um risco para sua saúde mental. Também comprou uma briga com a Venezuela, que a seu juízo não compartilha dados precisos. A fronteira, onde ambos os governos mantêm tensão em razão do contrabando, é um dos principais focos da doença. 

Embora tenha 2,1 mil grávidas com zika, o país não apresenta casos confirmados de microcefalia a partir de mães infectadas. A interpretação do governo para isso não é otimista. O primeiro caso só foi diagnosticado em 16 de outubro, razão pela qual o país ainda calcula passar pelos diagnósticos de bebês com problemas neurológicos que colocaram o Brasil nas manchetes mundiais. Ele e outros 14 ministros de Saúde do continente reuniram-se nesta quarta-feira, 3, em Montevidéu. A reunião foi organizada às pressas depois de a Organização Mundial da Saúde (OMS) prever que o vírus chegaria a todo o continente, exceto a Chile e Canadá. Gaviria espera do Brasil informação que reduza o impacto das picadas do Aedes aegypti em seu país. 

O Brasil fez bem em admitir que não conseguiu combater o mosquito como deveria?

Não somos os indicados para julgar a ação de outros países. Em geral, as atividades de controle do mosquito não foram efetivas porque vão além do que podem fazer as autoridades de saúde pública.

No que errou a Colômbia, o país mais atingido pelo zika depois do Brasil? 

É preciso pesar duas evidências. Os sistemas de diagnóstico e contagem na região são diferentes, mas os de Brasil e Colômbia são bons. Além disso, o vírus aparece mais forte em zonas similares de toda a América Latina e Caribe: áreas secas, urbanas e de baixa altitude. Esses dois fatores sugerem que o avanço do zika não está relacionado com os sistemas de saúde pública. Ele supera a capacidade dos países.

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O que muda na prática com o decreto de emergência emitido pela OMS?

O alerta é positivo. Dá visibilidade ao risco e faz as pessoas adotarem medidas de prevenção. Mas também nos coloca um desafio, pois aumentará a demanda por serviços do Estado. 

Esse encontro de ministros em Montevidéu pode dar algum resultado concreto?

A reunião permite desenhar estratégias conjuntas e dividir experiências com sucesso. É importante aprendermos com os outros países, principalmente no que se refere à comunicação, à prevenção e ao desafio da assistência no caso de alterações neurológicas e microcefalia. 

É possível traçar um rumo comum de combate ao mosquito na América? Não tem havido cooperação entre Colômbia e Venezuela, por exemplo. 

Infelizmente, não temos ações unificadas com a Venezuela. Não temos comunicação entre os dois países. Na verdade, a fronteira, principalmente a cidade de Cúcuta e seus arredores, é uma das zonas mais afetadas do país.

O senhor fala muito do efeito do fenômeno El Niño sobre o zika na Colômbia. Em que o aquecimento das águas do Pacífico afeta o contágio?

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O fenômeno agrava o problema, pois aumenta o calor e a estiagem no país. Isso favorece a reprodução do mosquito e induz ao armazenamento inadequado de água pela população.