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Pré-adolescentes são os principais alvos de violência doméstica em Fortaleza

Pesquisadora da USP analisou 343 casos registrados no IML da cidade no 2º semestre de 2008

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Por Redação
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SÃO PAULO - A violência doméstica praticada contra crianças e adolescentes na região metropolitana de Fortaleza (CE) predomina na faixa etária de 10 a 14 anos. Hellena Carvalho, médica legista responsável por uma pesquisa sobre o tema, aponta que os pré-adolescentes representam 39,1% dos casos levantados. Segundo ela, esse dado contradiz alguns estudos na área. “As pesquisas apontam que normalmente a violência doméstica acontece com a faixa etária de zero a 9 anos, na infância, em função da própria condição de defesa da criança e da maior dependência de seus cuidadores”, afirma. O motivo da predominância da violência na faixa etária de 10 a 14 anos não foi estudado, mas Hellena acredita que as características do próprio contexto da Região Nordeste podem ter influenciado. Mas isso é apenas uma hipótese. O trabalho da médica faz parte de sua tese de doutorado defendida pela Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP, sob orientação da professora Maria Helena Jorge. Nele, Hellena analisou 343 casos de violência doméstica registrados no Instituto Médico Legal (IML) de Fortaleza no segundo semestre de 2008. Os casos são de crianças e adolescentes vítimas de atos violentos cometidos pelos próprios pais ou responsáveis, como uso de força física, abuso sexual ou negligência. O que mais chamou a atenção dela foi a declaração de alguns pais (cerca de 40%) que justificavam por que batiam nos filhos. “Eles acreditam que bater educa os filhos. Argumentavam que também apanharam de seus pais e diziam: ‘Eu sei que isso vai dar vergonha na cara deles’”, conta. Outro ponto que Hellena destaca é a falta de profissionais nas áreas de saúde e de educação que denunciam esse tipo de violência. Dos casos analisados, nenhum foi notificado por profissional de saúde, e apenas 1,7% foi delatado por profissionais de educação. A médica lembra que, pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), esses profissionais são obrigados a procurar o Conselho Tutelar, mesmo em casos suspeitos, com a finalidade de abrir uma investigação. “Acredito que esses profissionais de saúde não têm a formação adequada sobre a violência doméstica como um problema de saúde pública. Na educação, os professores não estão devidamente capacitados, além daqueles que acham que não devem se meter ou têm medo de retaliações”, afirma Hellena. “É um problema complexo, que não dá para explicar com um único motivo”, completa. Na pesquisa, o principal notificante foi a mãe, em 48,4% dos casos. Em apenas 4% das ocorrência, a vítima foi o principal denunciante. Caracterização Para complementar as informações sobre vítima, família, agressor e circunstâncias em que ocorreu a violência, a pesquisa usou um formulário específico, aplicado ao responsável, acompanhante e vítima, quando as condições assim o permitiram. Foram constatados 172 casos de violência física, 167 de violência sexual e 4 de violência múltipla, que envolve mais de um tipo de violência (sendo três casos de violência física e sexual e um caso de violência física e negligência). As vítimas de violência física se distribuíram equitativamente entre os sexos (feminino, 55% e masculino, 45%), enquanto nos casos de violência sexual foi observado que o sexo feminino corresponde a 82% das vítimas. Nessa situação, o principal agressor foi o padrasto (32,3%), seguido do pai (30%). Hellena aponta um dado que vai contra o esperado: quase 50% dos casos de violência doméstica contra crianças e adolescentes ocorreram em famílias nucleares, ou seja, aquelas formadas por pai, mãe e filho(s) que convivem na mesma casa. Segundo a médica, os estudos, em geral, apontam que as famílias não nucleares estão mais sujeitas à violência doméstica. Independente da característica dos casos, segundo a legista, os estudos estão demonstrando que a violência vai contra a saúde física e mental das pessoas. “A vítima, ao chegar à fase adulta, tem mais chances de apresentar problemas de saúde como depressão, esquizofrenia e hipertensão”, explica.

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