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Quais motivos podem levar o Brasil a ser o novo epicentro do coronavírus?

País é o 3º no mundo com mais casos acumulados da doença, atrás apenas dos Estados Unidos e da Rússia; há uma semana, era o 8º no ranking

Por Érika Motoda
Atualização:

O Brasil passou a figurar no pódio dos países com mais casos de contaminação pelo coronavírus em menos de três meses desde a detecção do primeiro caso no País. Com os 254,2 mil casos divulgados pelo Ministério da Saúde na segunda, 18, o Brasil ultrapassou o Reino Unido e está atrás apenas de Estados Unidos (1,5 milhão) e Rússia (290,6 mil). Para efeitos de comparação, o Brasil estava na 8ª posição há seis dias; na última terça, 12, o País registrava 169.594 casos. 

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No atual cenário da pandemia, as taxas de isolamento estão baixas, o que, consequentemente, aumentam os níveis de transmissão. O sistema de saúde público está colapsando e já se fala em estabelecer protocolos para escolher quem vai ter acesso ao tratamento em detrimento de outros doentes. 

Disputas políticas também têm influência no desempenho do País. Na esfera federal, há a defesa do retorno às atividades normais para frear a recessão que será causada pelo coronavírus. Do outro lado, governos estaduais optam por não desrespeitar as recomendações de isolamento. 

Funcionários de uma funerária no Rio de Janeiro removem um corpo que estava na calçada da comunidade de Arara; segundo moradores, corpo demorou 30 horas para ser retirado Foto: Ricardo Moraes/ Reuters - 17/5/2020

Baixa taxa de isolamento

A média de isolamento no País está em 43,4%, enquanto que especialistas apontam para a necessidade de o número mínimo ser de 70%. Todos os Estados apresentaram índice de isolamento inferior a 51%.

O Estado de São Paulo, que é o epicentro da doença, está em quarentena desde o dia 24 de março. Segundo especialistas, o isolamento social precisaria durar ao menos dois meses para conter o coronavírus. Mas, como pontuou o infectologista consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) Marcelo Otsuka, o isolamento nunca foi adotado de fato no País. “Se o isolamento tivesse seguido efetivamente, estaríamos pelo menos vivenciando a possibilidade de uma abertura controlada, como a Europa agora, mas é possível que essa situação se prolongue”, afirmou. “Se vamos ser os primeiros no ranking, vai depender do comportamento da população.”

Taxa de transmissão

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Enquanto o isolamento social não é respeitado, é natural que a taxa de transmissão permaneça alta, já que a covid-19 encontra novos hospedeiros. Um estudo do Imperial College estima que pelo menos 4,2 milhões já foram contaminados com coronavírus no Brasil.

Falta de uniformidade 

A União e os Estados não falam a mesma língua. Enquanto os governadores estaduais estão estimulando a população a aderir ao isolamento social, o presidente Jair Bolsonaro é a favor do retorno ao trabalho para evitar a quebra de empresas por falta de consumo e gerar uma crise econômica. “Se afundar a economia, acaba o meu governo, acaba qualquer governo. É uma luta pelo poder”, justificou ao apresentador José Luiz Datena, da Rádio Bandeirantes, em entrevista concedida no dia 16 de março. Até mesmo funcionários públicos foram pressionados a voltar ao trabalho.

Bolsonaro ao lado de bandeira americana, durante manifestação a favor de seu governo e contra a quarentena em meio à epidemia do coronavírus, em 17 de maio Foto: REUTERS/Adriano Machado

Sem consultar o ex-ministro da Saúde Nelson Teich - que sucedeu Luiz Henrique Mandetta no comando da pasta durante a pandemia -, o presidente incluiu academias e salões de beleza como serviços essenciais e viu seu decreto ser ignorado pelos governadores.

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Mercado

Independentemente da estratégia de isolamento a ser adotada, o maior temor dos investidores é o prolongamento da pandemia ou uma segunda onda de infecções, explicou o analista da Ativa Investimentos Ilan Arbetman. Fato é que o mercado reagiu bem nos dias em que ogoverno anunciou pacotes monetários e fiscais para a pandemia, como a injeção de liquidez na economia pelo Banco Central e a aprovação de ajuda emergencial de R$ 600

Por mais que a atividade econômica tenha diminuído, a demanda de determinados produtos e serviços ainda existe durante a pandemia, lembrou Arbetman. Mas se grande parte dos trabalhadores ainda vai sentir os graves impactos financeiros, isso é porque o País conta com outro problema estrutural que data antes da pandemia: o mercado informal, cuja remuneração está diretamente associada ao aquecimento do comércio e dos serviços. São 36,8 milhões de trabalhadores informais, segundo o Instituto Brasileiro de Economia e Estatística (IBGE).

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“É preciso haver um equilíbrio para escolher quais serviços são indispensáveis para a economia não colapsar e nem por as pessoas em risco”, finalizou.

Leitos de UTI públicos em falta

Os leitos de UTI do sistema público já estão perto de lotar. Com 82% dos leitos de UTI ocupados, a Prefeitura de São Paulo decidiu solicitar 100 vagas à rede privada a uma diária de R$ 2.100 para cada paciente que atender. O valor é maior do que o que é pago à cidade pelo Sistema Único de Saúde (SUS), R$ 1.600 - quantia que desagrada hospitais da rede particular. 

O Conselho Nacional de Saúde, órgão ligado ao Ministério da Saúde, recomenda a requisição de leitos privados; a prática está prevista na Constituição. Mas até os hospitais particulares do Amazonas, Pará, Maranhão, Pernambuco, Ceará e Rio de Janeiro já enfrentam o superlotamento

Há projetos no Legislativo federal como o Projeto de Lei nº 2.333/20, de autoria do PSOL na Câmara, que cria uma fila única para o atendimento de pacientes com coronavírus em UTIs públicas e privadas. 

A fila única também é defendida pela Sociedade Brasileira de Bioética (SBB), que está elaborando parâmetros paraa seleção de pacientes que terão acesso às UTIs. "Eu estou aqui com um cara de 81 anos, presidente de banco, e com um jovem, que está preso lá em Bangu. Pois é, são aqueles dilemas que não têm uma solução única", explicou o presidente da SBB, Dirceu Greco, em entrevista ao Estado no último dia 12.

Resultado 

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O Brasil pode ter média de 90 mil mortes em decorrência do novo coronavírus até agosto, segundo o modelo estatístico elaborado pelo Institute for Health Metrics and Evaluation (IHME)

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