
02 de junho de 2020 | 11h00
BELÉM - O retorno das atividades econômicas em 47 municípios da região metropolitana de Belém, de Marajó Oriental, Baixo Tocantins e do Araguaia foi intenso. A movimentação desta segunda-feira, 1.º, principalmente na capital paraense, chegou próximo à normalidade, quando a cidade não estava ameaçada com a pandemia do novo coronavírus. Nos pontos de ônibus e no centro comercial, muita aglomeração e desrespeito aos protocolos de distanciamento social e sanitários, estabelecidos em decreto estadual e municipal, que preveem a retomada gradual da economia e da prestação de serviços.
A volta ao trabalho levou muitos paraenses às ruas e a movimentação foi alta tanto nos bairros nobres quanto na periferia, com a reabertura de 2.500 estabelecimentos comerciais que estavam fechados desde o dia 7 de maio. As ruas do centro ficaram lotadas de famílias que foram às compras, de pessoas que procuravam bancos, de comerciantes e lojistas.
Por volta das 9h30, uma fila se formou em frente à uma loja de decoração e de utilidades para o lar, próxima à prefeitura de Belém. Funcionários do estabelecimento tentavam manter a regra de 50% de ocupação do espaço, restringindo a entrada de clientes. Com chuva que caiu a tarde, porém, os consumidores entraram no local e ficaram todos aglomerados.
Ainda no centro comercial, houve disputa por uma vaga de estacionamento. Na Praça Felipe Patroni, que normalmente é bastante movimentada por estar cercada de órgãos públicos – atividade suspensa até o momento –, houve grande fluxo de consumidores indo ao comércio. Às 10h, filas de carros estavam à espera de vagas na Rua João Diogo.
Na Avenida 16 de novembro, os pontos de táxi e de ônibus estavam cheios. Os coletivos também passavam lotados, quando deveriam circular com menos da capacidade máxima de pessoas sentadas. No complexo do Ver-o-Peso, uma grande quantidade de ambulantes e consumidores tomava conta do espaço.
Pelas ruas estreitas do centro comercial, a maior parte das pessoas que circulavam fazia o uso de máscaras de proteção, mas se mantinham aglomeradas, sem respeitar o distanciamento social de 1,5 metro.
Grande parte dos lojistas não oferecia álcool em gel aos clientes, tampouco limitava o acesso à parte interna de uma pessoa por família, como rege o decreto municipal. A ocupação de maneira intercalada dos caixas de pagamento das lojas, para respeitar a distância mínima, pouco foi vista pela reportagem.
Um estabelecimento de produtos eletrônicos, localizado Rua 13 de Maio, tentou seguir as normas, com o controle da entrada de clientes. Porém, devido à calçada estreita, as pessoas na fila que aguardavam ao lado fora se esbarravam umas nas outras, disputando o curto espaço com carros e ambulantes.
Thelma Trindade, de 55 anos, foi às compras e disse que não imaginou encontrar tantas pessoas nas ruas. “Faço máscaras e roupas para vender, e resolvi comprar tecidos hoje. Mas já vou voltar pra casa, pois nunca imaginei ver tanta gente circulando no meio de uma pandemia”, espantou-se.
Ao tentar justificar o não cumprimento dos protocolos de higiene e de distanciamento, os lojistas culpam os governantes pela falta de informações concretas para o primeiro dia de retorno às atividades, depois do lockdown de três semanas e de mais uma semana com medidas de circulação mais rígidas. “Uma hora o governador diz que vai abrir tudo, depois, o prefeito diz que não vai. Não sabemos nem como nos preparar, nem a quem ouvir”, disse o vendedor José Carlos Mota.
Na última sexta-feira, em coletiva à imprensa, o governador Helder Barbalho (MDB) anunciou o programa Retoma Pará, com a liberação de 36 atividades econômicas, entre elas o comércio de rua, salões de beleza, barbearias e shoppings center. Na oportunidade, os protocolos a serem adotados na retomada e os meios de fiscalizações não foram anunciados. Segundo Barbalho, as informações sairiam em edição extra do Diário Oficial do Estado (DOE) no mesmo dia, mas não saiu.
O documento foi publicado apenas na manhã de domingo, 31, tendo o texto sido reeditado à tarde. O decreto prevê as medidas do programa Retoma Pará com o retorno dos segmentos econômicos de forma gradativa, mantendo o distanciamento e protocolos específicos, dada à classificação por nível de risco de cada região de saúde estabelecida pela gestão estadual.
A jurisdição das medidas, no entanto, é de competência da prefeitura municipal, que, por sua vez, publicou o Decreto n.º 96.378/2020 apenas na manhã desta segunda-feira, 1.º, quando os comerciantes já estavam na ativa.
Mesmo com o alvoroço dos belenenses para ter uma definição concreta de como seria o retorno às atividades, o prefeito de Belém, Zenaldo Coutinho (MDB), um dia após o anúncio do governo do Estado, apenas antecipou que não seguiria à risca o plano de Barbalho. Os dois são adversários políticos.
Zenaldo se manteve contrário a alguns pontos do plano estadual. Ele afirmou não concordar que Belém seja incluída junto à Região do Marajó Oriental e do Baixo Tocantins, na análise do programa Retoma Pará. Outro ponto questionado pelo gestor municipal foi a quantidade de segmentos autorizados a funcionar na cidade.
“Nós (Prefeitura) temos muitas convergências e concordâncias no que foi apresentado, e, em alguns pontos, não há comunicação entre o que tratou o Estado e o que a municipalidade está tratando. Por exemplo, a inclusão de Belém em uma região trazendo o Marajó e o Baixo Tocantins. Isso tem rebaixado o conceito da possibilidade de abertura em Belém”, afirmou Zenaldo.
Entre uma das determinações municipais que contrariam o decreto estadual está a abertura de barbearias, salões de beleza e shoppings centers para esta segunda-feira. Estes estabelecimentos estão autorizados a reabrir somente na próxima quinta-feira, 4. Permanecem fechados também na capital paraense as academias de ginástica, bares, restaurantes e casas noturnas e estabelecimentos similares, atividades imobiliárias, agências de viagem e praias, balneários e clubes, que também estão proibidos pelo decreto estadual.
Em vídeo publicado nas suas redes sociais, Barbalho falou sobre o processo de reabertura. “Nas últimas 24 horas no Estado, lamentavelmente, perdemos duas vidas para o coronavírus. Mas se formos fazer uma comparação em determinados momentos do pico da doença, de fato há uma redução muito considerável”, comparou. As decisões foram tomadas a partir dos dados científicos que mostram a diminuição na curva de contágio e no número de óbitos, segundo o governador.
Barbalho pediu à população que não confunda esse processo gradativo com cenário de liberação geral. “Nós temos tratado isso de maneira científica para avaliar, dia a dia, o comportamento do contágio, número de óbitos, para tomada de decisão. Que todos possam seguir a orientação de cada município, que possam seguir a orientação do governo do Estado, que estabeleceu, através de coloração, o grau, o nível do risco de cada região de saúde, para que nós não tenhamos necessidade eventualmente de haver um regresso para estágios de maior restrição”, disse.
O Pará alcançou a 14.ª posição no ranking brasileiro de isolamento social no domingo, 31. Em números percentuais, a taxa representou 49,96% de pessoas se mantendo em casa para evitar a proliferação do novo coronavírus. O lockdown no Estado teve a duração de 17 dias e finalizou no último domingo, 24. No período de 25 a 31 de maio, durante a primeira semana sem a suspensão total de serviços não essenciais e o fim do controle do fluxo de pessoas em vias públicas, a média da taxa de isolamento foi de 44,33% em todo o Pará.
De acordo com o secretário de Segurança Pública e Defesa Social, Ualame Machado, o índice maior de pessoas nas ruas já era previsto. "A redução no índice de isolamento já era esperado, uma vez que após o lockdown as pessoas já podem sair de casa sem precisar comprovar a necessidade e sem serem multadas, além das atividades que começaram a ser retomadas hoje. É fundamental lembrar que não é o fim do isolamento social, é preciso manter todas as medidas possíveis para evitar o contágio e não termos que retroceder", afirmou.
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