Suíça sugere que soropositivo pode fazer sexo sem camisinha

Proposta sem precedentes seria válida em casos específicos e está sendo fortemente contestada

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Por Jamil Chade e de O Estado de S. Paulo
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Uma pessoa soropositiva pode manter relações sexuais sem preservativo e mesmo assim não contaminar seu parceiro: Para o governo suíço, isso é possível. Pela primeira vez, as autoridades sanitárias de um país admitem que irão recomendar que uma pessoa infectada pelo vírus do HIV possa ter relações sexuais sem preservativos.   Veja também:  OMS elabora guia para contenção de epidemia de aids no mundo  Guia da OMS no site do órgão (em inglês)  Epidemia de aids no mundo    Nesta semana, o governo suíço surpreendeu a comunidade internacional e anunciou que irá sugerir que soropositivos, em situações muito específicas, possam ter relações sexuais sem preservativos.   O tema ainda será levado pelas autoridades suíças ao Congresso Anual sobre Aids, que ocorre no México. Cientistas e mesmo a ONU soam o alerta contra a iniciativa, baseada em um estudo que avaliou até mesmo pacientes no Brasil.   A medida tem como objetivo "melhorar a qualidade de vida das pessoas contaminadas" e garantir uma "vida sexual normal". Mas o assunto está gerando polêmica no mundo acadêmico e mesmo entre especialistas.   Segundo uma comissão do departamento de Saúde do governo suíço, sob determinadas condições, portadores de HIV podem manter relações sexuais sem uso de camisinha. Para que isso seja possível sem que a outra pessoa seja infectada, algumas condições precisam ser cumpridas.   O paciente precisa seguir rigorosamente uma terapia antiviral e ser controlado regularmente. Durante seis meses não deve ser encontrado o vírus em suas mostras de sangue e o portador de HIV não deve ter outra doença sexualmente transmissível.   A Comissão Suíça para Questões Ligadas à Aids (CFS, na sigla em francês) admite que, na Suíça, o número de pessoas que estariam dentro desses critérios são poucas. Mesmo assim, a entidade aposta em sua recomendações.   O presidente da CFS, Pietro Vernazza, garante que "uma pessoa portadora do vírus HIV, submetida a uma terapia anti-retroviral que funciona, não transmite o vírus da Aids através de contatos sexuais". Um estudo, por exemplo, constatou que a terapia pode eliminar o vírus das secreções genitais. Segundo ele, a notícia significa uma grande melhora da qualidade de vida para aqueles que vivem com a doença.   Para chegar à conclusão, as autoridades suíças citaram um estudo feito em Porto Alegre, entre 2000 e 2006. O levantamento envolveu 93 casais sorodiferentes (um dos parceiros não é soropositivo), sendo que 41 dos parceiros portadores do HIV iniciaram uma terapia.   O resultado mostrou que seis parceiros foram contagiados pelo vírus da Aids de pessoas não tratadas. Um estudo feito durante 14 anos na Espanha também foi usado para basear a decisão dos suíços.   Ataques   Para o Programa das Nações Unidas sobre o Aids (Unaids), a recomendação dos suíços não pode ser aplicado nos países mais pobres. 90% dos 33 milhões de portadores de HIV vivem em países em desenvolvimento. A América Latina tem 1,7 milhão de pessoas com HIV positivo, um terço deles no Brasil.   Na Suíça, o número de casos de HIV aumentou no primeiro semestre e deve chegar a 800 novos casos neste ano. No total, cerca de 17 mil pessoas vivem com o vírus na Suíça.   Na avaliação de certos especialistas dentro da ONU, o anúncio chega a ser "irresponsável". "Nem todos no mundo tem acesso ao tratamento e podem achar que estão dentro dos critérios para ter sexo sem preservativo", afirmou um cientista na Unaids, que pediu para não ser identificado.   A ONG Aids Free Africa também é contra a iniciativa. "A mensagem (da CFS) é vaga demais. As pessoas simplesmente vão acreditar que não há problemas em fazer sexo sem preservativo", afirmou a entidade em um comunicado.   A Universidade de New South Wales, em Sidnei, chegou a calcular os estragos que a recomendação suíça geraria. O resultado do estudo foi publicado na revista Lancet e as conclusões são assustadoras. As chances de ser contaminado se multiplica por quatro numa relação sexual sem preservativos, em comparação a uma relação com o uso de camisinhas.

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