Unifesp lança técnica que permite paraplégico recuperar parte dos movimentos perdidos

Criado na Suíça, procedimento foi estudado em quatro brasileiros, que apresentam evolução; médicos explicaram, porém, que pacientes com lesões mais graves podem não responder

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Por Fabiana Cambricoli
Atualização:

Atualizada às 20h35

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SÃO PAULO - Pacientes tetraplégicos ou paraplégicos com lesão na medula conseguiram recuperar parte dos movimentos das pernas ao serem submetidos a uma cirurgia até então inédita no País apresentada ontem por uma equipe de médicos da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Criada na Suíça, a técnica consiste na aplicação de eletrodos que provocam estímulos elétricos em três nervos da região abdominal responsáveis por funções como o movimento das pernas e o controle das funções urinária e fecal.

Segundo Nucelio Lemos, ginecologista da Unifesp e responsável por trazer a técnica ao Brasil, quatro brasileiros já passaram pelo procedimento e todos tiveram algum tipo de evolução. Em todo o mundo, já foram mais de cem pacientes operados nos cinco países que dispõem da cirurgia. “Não tínhamos nenhuma outra opção para o paciente com lesão medular grave. Depois da cirurgia, já há vários pacientes que voltaram a andar”, disse. 

Um deles é o universitário Francisco Moreira, de 25 anos, que perdeu quase todos os movimentos dos membros inferiores e superiores após sofrer acidente quando praticava snowboard, em 2009.

Ele passou pela cirurgia para receber os eletrodos em dezembro do ano passado e, em menos de seis meses, já consegue caminhar dentro de uma piscina e dar pequenos passos com o auxílio de um andador.

“Além dos movimentos, ajudou a diminuir minha incontinência urinária. Antes, não conseguia ficar sem urinar por mais de quatro horas. Agora, aguento mais. Também tenho mais firmeza no tronco. Pode parecer pouco, mas faz uma grande diferença para o dia a dia de um cadeirante”, conta Moreira.

Os eletrodos são instalados junto a três pares de nervos: ciáticos (que controlam pés e quadril), femorais (que comandam o movimento do músculo da coxa) e pudendos (responsáveis pelo controle da urina e das fezes). Por meio de um controle remoto, o paciente controla os estímulos dependendo da etapa da reabilitação e da função que quer desempenhar.

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Mudança. Segundo os médicos, a neuroestimulação de nervos já existia. A novidade é o local onde os eletrodos estão sendo implantados. Antes, os aparelhos eram colocados na coluna. Agora, ficam diretamente nos nervos, o que possibilita respostas mais específicas.

Os médicos explicaram, no entanto, que pacientes com lesões mais graves, que levaram à perda de todos os movimentos do corpo, podem não responder à técnica. O resultado da intervenção vai depender do tempo de lesão. Quanto mais cedo for realizada a cirurgia, maiores as chances de bons resultados. “As lesões completas e as que atingem as vértebras mais altas são mais graves. Os melhores resultados são vistos em pacientes com lesões das vértebras T4 a T12”, disse Lemos.

No Brasil, a cirurgia, que custa de R$ 250 mil a R$ 300 mil, ainda não está disponível na rede pública, mas é coberta pelos planos de saúde.

Esperança. O universitário Francisco Moreira, de 25 anos, tinha acabado de completar o primeiro ano do curso de Medicina quando embarcou para os Estados Unidos para um intercâmbio de quatro meses. Na última semana da viagem, sofreu um acidente em uma estação de esqui em Aspen e fraturou a quinta vértebra do pescoço. Perdeu todas as funções musculares e os movimentos. Só teve parte da sensibilidade dos membros superiores preservada.

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“Os médicos me falavam que em cinco ou dez anos poderia surgir alguma técnica que me ajudasse. Nunca perdi a esperança”, diz. A técnica de implantação de eletrodos foi descoberta por acaso pela mãe do jovem, que é ginecologista e participava de um congresso no qual o procedimento foi apresentado para o tratamento da endometriose.

“Foi uma luz no fim do túnel. Tivemos dúvidas, mas ele quis muito fazer a cirurgia. Me emociono ao ver toda essa evolução dele. Mas a pessoa também deve estar disposta a se doar para a reabilitação. Ele sempre teve muito essa força interior”, diz Lígia Moreira, mãe do jovem.

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